Elsa Santos
Elsa Santos
06 Mai, 2020 - 12:20

Direito à greve: tudo o que deve saber

Elsa Santos

O que é e quais os limites do direito à greve? Estas são algumas das questões a que importa dar resposta. Saiba tudo.

funcionários em greve

O direito à greve está consagrado na Constituição da República Portuguesa. No entanto, a cada direito corresponde um dever.

Ao contrário do que possa parecer, pelas constantes greves noticiadas em tantos setores profissionais, o direito à greve não dispensa regras e limites.

Vale a pena perceber em que circunstâncias os trabalhadores podem fazer greve e quais as consequências.

TUDO SOBRE O DIREITO À GREVE

mulheres a exercer o seu direito à greve

Direito à greve: o que é?

A greve é, nos termos da Constituição, um direito irrenunciável dos trabalhadores. Compete aos mesmos definir o âmbito de interesses a defender através da greve.

Quem tem direito?

O direito à greve abrange todos os trabalhadores, sem exceção, independentemente do vínculo laboral, do setor de atividade ou de serem ou não sindicalizados.

No entanto, quando a greve exige algumas regras ou deveres, como o aviso prévio.

Aviso prévio

É um dos princípios básicos no direito à greve, o aviso prévio.

De acordo com o exposto no Código do Trabalho, o aviso prévio de greve prevê o seguinte:

  1. A entidade que decida o recurso à greve deve dirigir ao empregador, ou à associação de empregadores, e ao ministério responsável pela área laboral um aviso com a antecedência mínima de cinco dias úteis ou, em situação referida no n.º 1 do artigo 537.º, 10 dias úteis;
  2. O aviso prévio de greve deve ser feito por meios idóneos, nomeadamente por escrito ou através dos meios de comunicação social;
  3. O aviso prévio deve conter uma proposta de definição de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamento e instalações e, se a greve se realizar em empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, uma proposta de serviços mínimos;
  4. Caso os serviços a que se refere o número anterior estejam definidos em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, este pode determinar que o aviso prévio não necessita de conter proposta sobre os mesmos serviços, desde que seja devidamente identificado o respectivo instrumento.

Efeitos da greve

Não há greve sem efeitos imediatos, para trabalhadores e entidades patronais.

Assim, segundo a lei:

  1. A greve suspende o contrato de trabalho de trabalhador aderente, incluindo o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade;
  2. Durante a greve, mantêm-se, além dos direitos, deveres e garantias das partes que não pressuponham a efectiva prestação do trabalho, os direitos previstos em legislação de segurança social e as prestações devidas por acidente de trabalho ou doença profissional;
  3. O período de suspensão conta-se para efeitos de antiguidade e não prejudica os efeitos decorrentes desta.
Direito à greve: quais são as consequências de uma greve ilícita?
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GREVE: DIREITOS E DEVERES

Direito à greve: Serviços mínimos

Durante o período determinado para a greve, de acordo com o exposto no Artigo 537.º do Código do Trabalho, está prevista a obrigação de prestação de serviços nos seguintes casos:

  1. Em empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, a associação sindical que declare a greve, ou a comissão de greve no caso referido no n.º 2 do artigo 531.º, e os trabalhadores aderentes devem assegurar, durante a mesma, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação daquelas necessidades;
  2. Considera-se, nomeadamente, empresa ou estabelecimento que se destina à satisfação de necessidades sociais impreteríveis o que se integra em algum dos seguintes sectores:
    • a) Correios e telecomunicações;
    • b) Serviços médicos, hospitalares e medicamentosos;
    • c) Salubridade pública, incluindo a realização de funerais;
    • d) Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis;
    • e) Abastecimento de águas;
    • f) Bombeiros;
    • g) Serviços de atendimento ao público que assegurem a satisfação de necessidades essenciais cuja prestação incumba ao Estado;
    • h) Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho-de-ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respectivas cargas e descargas;
    • i) Transporte e segurança de valores monetários.
  3. A associação sindical que declare a greve, ou a comissão de greve no caso referido no n.º 2 do artigo 531.º, e os trabalhadores aderentes devem prestar, durante a greve, os serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações;
  4. Os trabalhadores afectos à prestação de serviços referidos nos números anteriores mantêm-se, na estrita medida necessária a essa prestação, sob a autoridade e direcção do empregador, tendo nomeadamente direito a retribuição.

Coação civil

O direito à greve é, ainda hoje, encarado como uma ameaça. Por isso, algumas entidades patronais teimam em tentar convencer os seus trabalhadores a não aderirem à greve.

Falamos, pois, de coação, o que se caracteriza-se pelo constrangimento físico ou moral para alguém fazer algum ato sob o fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família ou a seus bens.

É absolutamente proibido e ilegal qualquer tipo de coação, de tentativa de prejudicar ou discriminar um trabalhador que deseje aderir ou tenha aderido à greve. Assim, qualquer ato dessa natureza por parte do empregador constituem contra-ordenação muito grave, punível com pena de multa até 120 dias.

Requisição civil

É usada pelo Governo para travar a greve. Trata-se do decreto-lei 637/74.

A requisição civil é um instrumento que está na lei desde 1974 e só deve ser usada em

“circunstâncias particularmente graves”, tendo de ser decidida em Conselho de Ministros e efetivada por portaria. O decreto-lei 637/74 determina que a requisição civil pode ser acionada se for necessário “assegurar o regular funcionamento de serviços essenciais de interesse público ou de setores vitais da economia nacional”.

Esse “caráter excecional” pode ter como objeto

“a prestação de serviços, individual ou coletiva, a cedência de bens móveis ou semoventes, a utilização temporária de quaisquer bens, os serviços públicos e as emersas públicas de economia mista ou privadas”.

De acordo com o expresso no referido diploma, a requisição civil só tem justificação em “casos excecionalmente graves”.

Entre a lista de serviços ou empresas que podem ser objeto de requisição civil está “a prestação de cuidados hospitalares, médicos e medicamentosos”. A esses juntam-se outros, como exploração de serviço de transportes, produção e distribuição de energia ou produção e transformação de alimentos de primeira necessidade.

A requisição civil depende de reconhecimento de necessidade por parte do Conselho de Ministros. Para além disso, de ser efetivada pelos ministros que tutelam a área em causa. A portaria que defina a requisição civil tem de indicar o seu objeto e duração, a autoridade responsável por executar a requisição e o regime de prestação de trabalho dos requisitados.

A decisão deve ser dada a conhecer aos interessados através da comunicação social, produzindo efeitos imediatos.

Apesar do seu caráter extraordinário, a requisição civil foi já usada várias vezes para travar greves, nomeadamente em empresas de transportes (como CP ou TAP) ou dos enfermeiros dos blocos operatórios.

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