Cláudia Pereira
Cláudia Pereira
30 Out, 2025 - 15:30

Famílias portuguesas gastam até 83% do rendimento para ter casa

Cláudia Pereira

No 3.º trimestre de 2025, arrendar ou comprar casa em Portugal continua a exigir um esforço financeiro elevadíssimo. Lisboa, Funchal e Faro lideram nas dificuldades, enquanto cidades do interior oferecem algum alívio.

Viver em Portugal, sobretudo nas zonas costeiras e mais turísticas, tem-se tornado um verdadeiro teste à carteira das famílias. No terceiro trimestre de 2025, a média nacional da taxa de esforço no arrendamento atingiu os 83%. Na prática, isto quer dizer que, em média, uma família portuguesa gasta mais de 80% do salário só na renda da casa.

Esforço financeiro no limite em Lisboa, Funchal e Faro

No topo da lista, o Funchal destaca-se com uns impressionantes 100% de taxa de esforço. Ou seja, quem vive na capital madeirense, e não tem rendimentos acima da média, está a pagar a renda com todo o salário — e depois logo se vê como se pagam as outras contas. Faro surge logo a seguir com 93% e Lisboa fecha o pódio com 83%.

Estas três cidades são também destinos turísticos de peso, o que ajuda a explicar o fenómeno: maior procura, menos oferta e rendas que disparam. Para muitas famílias, viver onde trabalham já não é uma opção viável.

Comprar casa não é alternativa viável para muitos

Para quem pensa que a solução passa por deixar de arrendar e passar à compra, os números também não inspiram grande otimismo. A média nacional da taxa de esforço para aquisição de habitação está nos 70%, o que representa uma fatia muito significativa do orçamento familiar.

Em Lisboa, a taxa de esforço para comprar casa ultrapassa os 100%, mais concretamente, atinge os 111%. Isto quer dizer que, mesmo com um crédito bancário e as atuais taxas de juro (mais baixas do que em anos anteriores), uma família média teria de ganhar mais do que efetivamente ganha para conseguir pagar a prestação mensal. No Funchal, a taxa chega aos 99% e em Faro fica nos 93%.

Este cenário torna claro que, para muitas famílias, comprar casa na sua cidade de origem tornou-se uma miragem. É uma realidade que força muitas pessoas a procurar alternativas fora dos centros urbanos, com todas as consequências que isso traz em termos de qualidade de vida, transportes e equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.

As exceções que ainda permitem respirar

Nem tudo são más notícias, apesar do panorama geral ser preocupante, há ainda algumas cidades onde é possível viver com menos pressão sobre o orçamento familiar. No que toca ao arrendamento, cidades como Bragança (39%), Beja (37%) e Castelo Branco (37%) mostram que é possível arrendar casa com um nível de esforço mais sustentável.

Mais surpreendente ainda é o desempenho de Portalegre e Guarda, as únicas cidades com taxas de esforço no arrendamento dentro ou abaixo do limite recomendado de 33%. Nestes locais, uma família ainda consegue pagar a renda e ter margem para viver: pagar contas, alimentar-se, talvez até guardar algum dinheiro.

No mercado de compra, as diferenças são ainda mais acentuadas. Em cidades como Guarda (18%), Castelo Branco (18%) e Portalegre (20%), comprar casa é claramente mais acessível. Estes números contrastam fortemente com os grandes centros urbanos e reforçam o potencial do interior do país como alternativa habitacional.

Como é calculado o esforço habitacional?

A taxa de esforço é um indicador simples, mas muito revelador. Mede a percentagem do rendimento líquido de um agregado familiar que é gasta com a habitação, seja em rendas mensais ou na prestação de um crédito habitação.

No caso do arrendamento, o cálculo tem por base os preços médios de arrendamento divulgados pelo Idealista e os rendimentos médios do Instituto Nacional de Estatística (INE). Para a compra de casa, a taxa de esforço considera um crédito típico, com duração e taxa de juro médias, ajustado recentemente às novas condições de mercado, nomeadamente a descida das taxas de juro pelo Banco Central Europeu.

Este indicador serve como termómetro para avaliar a sustentabilidade financeira da habitação em diferentes regiões. Segundo as boas práticas, o valor ideal da taxa de esforço não deve ultrapassar os 30% a 35%. Infelizmente, em Portugal, esse valor é hoje uma raridade.

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