Share the post "Carregar enquanto conduz? França já tem uma estrada que o permite"
Em pleno coração da Europa, a França tornou-se o primeiro país a testar, em ambiente real, uma secção de autoestrada capaz de carregar veículos eléctricos enquanto estes circulam. O projeto decorre na A10, uma das principais vias do país, gerida pela Vinci Autoroutes, e apresenta um troço de 1,5 quilómetros equipado com tecnologia de carregamento por indução.
Este sistema faz parte da iniciativa europeia “ASFA”, que visa promover soluções sustentáveis e inovadoras para o transporte rodoviário. Mais do que uma curiosidade tecnológica, esta estrada representa um salto estratégico na transição energética da mobilidade, com especial enfoque no transporte de mercadorias, historicamente difícil de electrificar.
Como funciona a tecnologia
O sistema é baseado em bobinas de cobre embutidas sob a superfície da estrada. Estas bobinas geram um campo electromagnético que transfere energia para os veículos equipados com receptores apropriados. O processo é semelhante ao carregamento sem fios de telemóveis, mas em grande escala e a alta velocidade.
Durante os testes, foi possível registar transferências de energia superiores a 300 kW, o que é mais do que suficiente para alimentar camiões pesados durante o percurso. Estes veículos, ao passarem sobre a faixa electrificada, recebem energia em tempo real, o que lhes permite manter a carga da bateria ou até dispensar grandes reservas de energia acumulada. O sistema é compatível com velocidades de tráfego reais, o que é essencial para a integração plena em ambientes rodoviários existentes.
O impacto da estrada que carrega veículos em andamento
Atualmente, os veículos eléctricos de transporte pesado enfrentam limitações: baterias volumosas e caras, longos tempos de carregamento e a necessidade de infra‑estruturas específicas nas paragens. Ao permitir que os veículos carreguem em movimento, esta tecnologia resolve várias destas questões numa só solução.
Reduzir a dimensão das baterias também contribui para a sustentabilidade do próprio processo de fabrico, diminuindo o uso de metais raros e o peso dos veículos. Menos peso significa menos consumo energético e menos desgaste da via.
Com esta solução, é possível imaginar um futuro em que a autonomia deixa de ser uma preocupação. Os veículos poderiam circular indefinidamente, desde que tenham acesso a estas vias equipadas, o que pode ser especialmente relevante em longos corredores logísticos entre centros urbanos e portos.
Os obstáculos que a estrada eléctrica ainda precisa ultrapassar
Apesar do entusiasmo, há questões práticas que não podem ser ignoradas. Em primeiro lugar, o custo da implementação é elevado: equipar milhares de quilómetros com bobinas de indução representa um investimento significativo. Também é necessário criar normas europeias que assegurem a compatibilidade entre diferentes marcas e modelos de veículos.
Outro ponto crítico é a durabilidade da tecnologia. As estradas estão sujeitas a desgaste intenso, variações climatéricas e tráfego pesado. Manter o sistema em bom funcionamento exigirá soluções robustas e planos de manutenção eficazes.
Há ainda o desafio de gestão energética: como medir e cobrar o consumo de cada veículo? E quem deve suportar os custos: o utilizador, o operador rodoviário ou o Estado? Estas são perguntas em aberto que exigem consenso político e colaboração entre múltiplos setores.
De troço piloto a rede europeia: o plano para o futuro
O troço de teste na A10 é apenas o início. A empresa Electreon, que lidera o desenvolvimento da tecnologia, já anunciou planos para expandir o conceito para outras partes da Europa. O objetivo é integrar esta solução em grandes corredores logísticos e, eventualmente, em áreas urbanas.
A médio prazo, prevê-se que este modelo conviva com outras formas de carregamento como estacionário, ultra‑rápido e até solar. A visão é clara: tornar o transporte eléctrico mais prático, acessível e eficiente. França arriscou, e agora todos os olhos estão voltados para este laboratório em movimento.
Se tudo correr como previsto, este poderá ser o início de uma nova era rodoviária, onde a estrada, além de nos levar ao destino, também nos dá energia para lá chegar.