Cláudia Pereira
Cláudia Pereira
24 Set, 2025 - 16:30

Nova diretiva europeia de viagens organizadas: o que muda para quem viaja

Cláudia Pereira

Conheça as alterações propostas à diretiva europeia de viagens organizadas. Saiba quais os novos direitos para os viajantes, os desafios para as agências e o impacto previsto no mercado.

Viajar é bom, mas viajar com segurança jurídica é ainda melhor. A União Europeia decidiu rever a diretiva das viagens organizadas para responder às mudanças no mercado e reforçar os direitos dos consumidores.

A nova versão da diretiva, aprovada pelo Parlamento Europeu em setembro de 2025, não traz apenas boas intenções, também inclui alterações concretas para agências, operadores e viajantes.

Neste artigo, encontra um resumo claro e completo sobre o que muda na prática, quais os impactos para Portugal e como o setor turístico poderá adaptar-se às novas regras.

O que é a diretiva atual e por que razão foi revista

A Directiva (UE) 2015/2302 entrou em vigor em 2018 e substituiu a antiga diretiva de 1990. Regula as viagens organizadas — os conhecidos “pacotes turísticos” — e serviços de viagem combinados, que incluem, por exemplo, transporte, alojamento e excursões. A sua função principal é proteger os consumidores europeus quando contratam este tipo de viagens, seja numa agência física ou através de plataformas digitais.

Mas o mercado turístico evoluiu. Hoje, é comum reservar voos, hotéis e atividades de forma independente, em sites diferentes, num só processo. O conceito de “pacote” tornou-se mais flexível e menos claro. A revisão da diretiva surge, portanto, como resposta a estas novas práticas. O objetivo é atualizar a legislação, torná-la mais clara e eficaz, e garantir que o consumidor está protegido, mesmo num ambiente digital.

Principais alterações propostas

A nova diretiva não muda tudo, mas introduz novidades importantes, nomeadamente:

1.

Protecção reforçada em caso de insolvência

Durante a pandemia, milhares de viajantes perderam dinheiro por cancelamentos e falências. Esta situação expôs fragilidades na protecção ao consumidor.

A nova directiva exige mecanismos mais robustos para garantir o reembolso ou repatriamento dos viajantes, caso o organizador da viagem entre em insolvência.

Esta obrigação aplica-se a todos os operadores, mesmo aqueles que vendem online a partir de outros países da União Europeia.

2.

Mais transparência na fase pré-contratual

Os operadores serão obrigados a apresentar de forma clara e acessível:

  • O preço total da viagem, com todas as taxas incluídas;
  • As condições de pagamento;
  • As políticas de cancelamento;
  • A identidade do organizador (e não apenas do intermediário);
  • A responsabilidade em caso de problemas.

O consumidor deixará de ter dúvidas sobre quem responde por atrasos, alterações ou falhas. Reduz-se, assim, o risco de mal-entendidos ou de “jogos de empurra” entre entidades.

3.

Inclusão de novas formas de reserva

Hoje, muitos consumidores combinam por conta própria voos, alojamento e outros serviços turísticos. Se esta combinação for feita com base numa relação comercial entre prestadores, ou mediada por um operador, passa a ser abrangida pela diretiva.

Mesmo que o cliente finalize cada compra em separado, se tudo estiver interligado, a proteção aplica-se. Esta alteração procura eliminar brechas na legislação anterior.

4.

Regras mais uniformes em toda a União Europeia

A anterior versão da diretiva era interpretada de forma diferente entre Estados-Membros, o que criava insegurança jurídica.

A nova proposta pretende criar regras mais uniformes e claras, válidas para todos os países, o que facilita a atuação das agências de viagens e aumenta a confiança dos consumidores ao viajarem dentro da UE.

Benefícios para os viajantes

Estas mudanças trazem vantagens práticas para quem viaja. Há, desde logo, mais segurança jurídica, pois o consumidor fica melhor protegido, independentemente de onde reserve a viagem. Além disso, há mais clareza: o viajante saberá sempre quem é o responsável pela viagem, quanto paga e o que está incluído.

Também se reforçam os direitos, já que, se algo correr mal, os mecanismos de reembolso e compensação serão mais eficazes. Por fim, há mais confiança. A nova directiva introduz garantias adicionais, o que poderá incentivar mais pessoas a optarem por pacotes organizados.

Estas alterações têm ainda como objectivo reduzir o número de conflitos entre consumidores e operadores, ao clarificarem desde o início quem responde por cada aspecto da viagem.

Críticas e desafios do setor

Apesar das intenções positivas, o setor do turismo — sobretudo as pequenas e médias empresas — manifesta preocupação. A ANAV (Associação Nacional de Agentes de Viagens) alerta para os custos adicionais associados à adaptação às novas regras, referindo, por exemplo, a necessidade de reforçar garantias financeiras, rever os contratos de prestação de serviços, atualizar os sites e sistemas de reservas, e ainda formar as equipas para cumprirem as novas exigências legais.

Alguns operadores temem que estas alterações venham a favorecer as grandes plataformas digitais, em detrimento das agências tradicionais, que poderão ter maiores dificuldades em adaptar-se rapidamente.

Existe também o risco de certos operadores deslocarem a sua atividade para fora da União Europeia, como forma de contornar estas obrigações, criando situações de concorrência desleal no mercado europeu.

Situação em Portugal

Portugal transpôs a diretiva de 2015 através do Decreto-Lei n.º 17/2018, que estabelece o regime jurídico da atividade das agências de viagens e turismo. Com a aprovação das novas alterações a nível europeu, este diploma terá agora de ser revisto para incorporar as exigências recentemente aprovadas.

Compete ao Turismo de Portugal e às entidades reguladoras garantir que as novas regras sejam devidamente implementadas, fiscalizadas e comunicadas ao setor. Para as agências de viagens nacionais, isso significará rever as condições gerais de venda, assegurar novas garantias financeiras, disponibilizar toda a informação exigida ao consumidor e estar preparadas para responder a reclamações com base nos direitos reforçados que a nova legislação consagra.

É fundamental que o Governo português assegure uma transposição equilibrada da nova directiva, protegendo a competitividade das empresas nacionais, em especial das pequenas e médias, que poderão sentir maior pressão para cumprir os novos requisitos.

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