Miguel Pinto
Miguel Pinto
15 Dez, 2025 - 12:00

Portugal: metade dos reformados recebe menos de 462 euros

Miguel Pinto

Um estudo do Banco de Portugal traça um retrato pouco animador da situação dos reformados em Portugal. Conheça as conclusões.

reformados com pensões baixas

A realidade das pensões de velhice em Portugal revela contrastes profundos que espelham as assimetrias acumuladas ao longo de décadas no mercado de trabalho e as consequências nos reformados.

Um estudo recente do Banco de Portugal, intitulado “Os pensionistas de velhice em Portugal: uma análise com microdados”, traça um panorama detalhado sobre os 2,5 milhões de reformados dos regimes públicos, que representam 23% da população nacional.

Os dados de 2024 revelam que metade dos pensionistas do regime geral da Segurança Social recebia menos de 462 euros mensais, enquanto a pensão média se situava nos 645 euros.

Esta discrepância evidencia uma distribuição fortemente concentrada em valores baixos, com apenas 5% dos pensionistas a receber mais de 1.685 euros.

O estudo, elaborado pelas economistas Cláudia Braz, Sharmin Sazedj e Lara Wemans, demonstra que a proximidade entre a pensão média e o percentil 75 indica que a maioria dos reformados aufere valores significativamente inferiores à média.

Esta assimetria reflete não apenas as trajetórias profissionais fragmentadas de muitos trabalhadores, mas também as profundas desigualdades que marcaram o mercado laboral português nas últimas décadas.

Reformados: 40% vivem com pensões mínimas

Em 2024, cerca de 40% dos reformados (804 mil pessoas) encontravam-se a receber a pensão mínima, cujo valor varia entre 319,49 euros para carreiras inferiores a 15 anos e 462,28 euros para carreiras superiores a 30 anos.

Esta realidade coloca uma parcela significativa da população idosa numa situação de vulnerabilidade económica, especialmente quando confrontada com o aumento do custo de vida.

Dos 2,5 milhões de pensionistas de velhice dos regimes públicos, dois milhões pertencem ao sistema da Segurança Social e 440 mil à Caixa Geral de Aposentações, subsistema fechado a novas inscrições desde 2006 que abrange funcionários públicos.

A idade média destes pensionistas situa-se nos 75 anos, sendo que as mulheres vivem, em média, mais 15 meses do que os homens.

O peso do género nas reformas

As diferenças de género constituem uma das dimensões mais preocupantes do panorama das pensões em Portugal. A pensão média das mulheres situava-se em 490 euros em 2024, cerca de 40% abaixo do valor recebido pelos homens.

Quando se considera a soma das pensões de velhice e de sobrevivência, esta disparidade reduz-se para 28%, evidenciando o papel das pensões de sobrevivência na mitigação das desigualdades entre os reformados mais idosos.

A incidência das pensões mínimas é particularmente acentuada entre as mulheres, com 60% das pensionistas a receberem pensões mínimas em 2024, comparativamente a apenas 19% dos homens.

Apesar de persistente, o diferencial de género tem vindo a diminuir gradualmente. Entre 2018 e 2024, a disparidade nas pensões entre homens e mulheres reduziu-se de 44% para 40%.

A idade e o valor das pensões

A análise por grupos etários revela outra dimensão da desigualdade, ou seja, quanto maior a idade, menor tende a ser o valor da pensão.

Os pensionistas com menos de 65 anos apresentavam uma pensão média próxima de 770 euros, valor que diminui gradualmente até aos 537 euros entre os pensionistas com 80 ou mais anos.

Esta tendência deve-se a vários fatores, incluindo carreiras contributivas mais curtas e salários médios mais baixos entre gerações mais antigas.

Reforma antecipada ainda é escolha

Em 2024, 38% dos novos pensionistas reformaram-se antes da idade legal de 66,3 anos, contra 32% que o fizeram exatamente com essa idade e 31% após a idade legal.

Esta opção tem um custo elevado, já que as penalizações aplicadas às reformas antecipadas podem traduzir-se numa redução superior a 20% no valor da pensão, incluindo o fator de sustentabilidade de 14,67% e 0,5% por cada mês de antecipação.

A idade média dos reformados tem vindo a aumentar de forma consistente desde 2018, passando de 64,7 anos em 2019 para 65,4 anos em 2024, refletindo o impacto dos mecanismos de penalização e o adiamento voluntário da saída do mercado de trabalho.

Segundo estimativas provisórias, a idade legal de reforma deverá fixar-se em 66 anos e 11 meses em 2027.

Reformados a trabalhar? Só os mais privilegiados

Trabalhar na reforma

Cerca de 10% dos novos reformados continuaram a exercer atividade laboral após o início do pagamento da pensão. Este grupo apresenta, contudo, um perfil específico, já que são predominantemente beneficiários com pensões mais elevadas.

Os dados mostram que os novos pensionistas que continuam a trabalhar recebem, em média, 933 euros, face aos 591 euros entre os que cessam completamente a atividade.

Esta realidade sugere que os incentivos ao prolongamento da vida ativa, que incluem bonificações de até 1% por cada mês de trabalho após a idade legal de reforma, beneficiam sobretudo aqueles que já dispõem de reformas mais robustas, não constituindo uma solução efetiva para quem aufere pensões mínimas ou próximas do limiar de pobreza.

Desafios futuros do sistema de pensões

As autoras do estudo sublinham que, num contexto de envelhecimento demográfico e de transformações económicas e sociais, o principal desafio a médio e longo prazo passa por garantir a sustentabilidade e a confiança no sistema.

As projeções da Comissão Europeia apontam cenários preocupantes, com a pensão média dos portugueses a poder cair de 69,4% do último salário em 2022 para apenas 38,5% em 2050, caso não sejam promovidas reformas estruturais.

Fontes

Este artigo foi baseado no estudo “Os pensionistas de velhice em
Portugal: uma análise com microdados”, integrado no Boletim
Económico de dezembro de 2025 do Banco de Portugal,
da autoria de Cláudia Braz, Sharmin Sazedj e Lara Wemans.

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