Viviane Soares
Viviane Soares
30 Mai, 2018 - 09:30

TEDxPorto: entrevista a Sérgio do Monte Lee

Viviane Soares

O E-konomista entrevistou Sérgio do Monte Lee, especialista no setor da Tecnologia, Media e Telecomunicações. O Technology Optimist esteve no TEDxPorto a falar, precisamente, sobre tecnologia e deixou umas notas sobre o que esperar do futuro e da revolução digital.

TEDxPorto: entrevista a Sérgio do Monte Lee

O TEDxPorto realiza-se anualmente desde 2010 e é já um evento de relevo nacional, tendo tido sempre, desde a sua primeira edição, casa cheia e oradores de renome nacional e internacional. Organizado por uma equipa local e independente, a conferência deste ano – que teve lugar na Casa da Música, a 14 de abril, não fugiu à regra. Além dos mais de 5000 que assistiram ao evento via livestreaming, estiveram presentes no evento principal 1085 espectadores (números oficiais).

Sob a égide do tema “É Natural”, e tendo por base o princípio – “Ideas Worth Spreading” -, o evento chamou à Invicta 16 oradores de renome que abordaram a temática aplicada às áreas da saúde, tecnologia, marketing, física, arte. Será que o que é natural é melhor do que o artificial? Em todas as condições e situações?

Depois de Pedro Geraldes, um dos principais organizadores do evento, a equipa do E-Konomista entrevistou Sérgio do Monte Lee, um Technology Optimist, especialista no setor da Tecnologia, Media e Telecomunicações.

Sérgio Lee tem focado a sua actividade na área de estratégia e operações, onde tem assumido cargos de liderança em diversas geografias, nomeadamente na Europa e América Latina. Sócio da Deloitte e professor universitário, o especialista abordou o tema da tecnologia no TEDxPorto, que, na sua opinião, se tem tornado um conceito mal-amado e incompreendido ao longo da história.

entrevista-sergio-lee

TEDxPorto: E-Konomista entrevista Sérgio Lee

Contrariando tendências pessimistas, acredita que alguns empregos do presente vão desaparecer, mas que empregos do futuro colmatarão esse desaparecimento. Gostaria de clarificar e exemplificar?

De acordo com vários estudos, vão desaparecer nas próximas décadas cerca de 50% dos empregos, em grande medida por introdução de maior automatização/robotização. Por exemplo, a massificação dos “self-driven vehicles” vai seguramente colocar em risco de extinção a profissão de motorista, uma das que mais emprega a nível mundial.

Esta tendência seria preocupante se apenas se antevisse eliminação de emprego. Eu acredito na substituição de emprego. E o passado dá-nos argumentos para ser otimistas.

“Eu acredito na substituição de emprego”

Historicamente, a introdução de tecnologia tem sempre criado mais emprego do que destruído. Veja-se o que se passou com a revolução industrial que, embora alterando de forma significativa a estrutura de emprego, gerou muito mais empregos que os que eliminou. Certamente que mais de 50% dos empregos da pré-revolução industrial também não existem hoje.

Os mais pessimistas referem a inteligência artificial como o grande “bicho papão” do emprego futuro, com o risco da substituição do homem pela máquina. Conforme mencionei na minha intervenção, parece-me exagerada a designação de inteligência artificial e mais ainda o receio de inteligência substituída, tendo em conta que a máquina prevalece sobre o ser humano apenas numa das 9 dimensões de inteligência, a lógico-matemática.

Noutras dimensões, tais como por exemplo a inteligência linguística, a visual-espacial ou a interpessoal, o ser humano continua e continuará a prevalecer. Por conseguinte, e não duvidando da evolução tecnológica, acredito mais no conceito de inteligência aumentada que no de inteligência artificial, ou seja, na exponenciação do fator trabalho mais do que na sua substituição.

“Acredito que no futuro trabalharemos menos e trabalharemos melhor”

A tecnologia substituirá e melhorará a performance do ser humano nas tarefas mais repetitivas, rotineiras e programáveis. Haverá claramente espaço para o crescimento de profissões relacionadas, por exemplo, com personalização e com interação ou serviço a cliente.

Adicionalmente, os ganhos de produtividade que se anteveem também permitirão que no futuro trabalhemos menos horas, tal como hoje em dia trabalhamos muito menos horas do que se verificava no início da revolução industrial.

Em conclusão, acredito que no futuro trabalharemos menos e trabalharemos melhor e, por conseguinte, teremos profissões nas quais nos sentiremos mais realizados.

entrevista-sergio-lee

Numa altura em que as “fraquezas” da tecnologia estão na ordem do dia, consegue enumerar algumas das principais mudanças positivas que tivemos nas nossas vidas com novidades tecnológicas?

Conforme mencionei, a tecnologia não só tem estado presente, como tem sido em grande medida responsável pela evolução do ser humano. Um computador é tecnologia, tal como é um equipamento industrial, a agricultura ou até o manuseio do fogo para cozinhar os nossos alimentos. E todas estas tecnologias, e muitas outras, foram fundamentais para a nossa evolução e conduziram a que vivamos hoje na melhor época da história da humanidade.

Nunca na nossa história tivemos índices tão baixos de fome, de pobreza extrema, de iliteracia, de mortalidade infantil e até de mortes por conflitos armados.

A razão das “fraquezas” da tecnologia estarem na ordem do dia está relacionada, na minha perspetiva, com o contexto da revolução que vivemos hoje, uma revolução assente na conectividade e que acontece de forma muito rápida e com impactos exponenciais.

Estas características trazem transformações muito rápidas, que mudam a forma como vivemos de forma significativa e acelerada. E é esse receio da incerteza, ainda por cima próxima, que gera algum sentimento antagónico relativamente à tecnologia.

“As fraquezas apontadas às tecnologias resultam muito mais de uma deficiente utilização das mesmas”

Vejamos o exemplo das redes sociais, tantas vezes criticadas por induzir demasiada superficialidade ou por disseminar falsa informação. Também são as mesmas redes sociais que conduzem a um maior escrutínio, sensibilização e mobilização social para causas muito úteis, como é o caso do ambiente.

As fraquezas apontadas às tecnologias resultam muito mais de uma deficiente utilização das mesmas do que propriamente das suas características intrínsecas. Um telefone móvel é muito útil, mas não é muito sensato o mantermos ligado durante a noite ou o utilizarmos enquanto conduzimos.

entrevista-sergio-lee

E o futuro? O que vem por aí a curto, médio prazo?

Vivemos hoje os primeiros anos do que provavelmente será a maior revolução da história da humanidade. É uma revolução digital que combina duas tecnologias, o telefone e o computador, e que é uma revolução assente na conectividade. Se recuarmos na história, é fácil entender a importância da conectividade. Foram os povos e as civilizações que mais se abriram a trocas comerciais, de pessoas e de ideias que tiveram um crescimento mais acelerado. Não é um acaso que as cidades mais desenvolvidas do mundo estejam geograficamente colocadas junto a portos fluviais, marítimos ou oceânicos.

O contexto que vivemos hoje e que em breve conectará todas os seres humanos do mundo, seres humanos com máquinas e máquinas com máquinas, suportado por capacidades computacionais que evoluem de forma exponencial, já começou a trazer um processo transformacional sem paralelo e que deverá acelerar nos próximos anos.

O futuro será, por conseguinte, muito diferente do que temos hoje. Conceitos que pareciam ficção científica há uns tempos atrás, como são o caso dos self-driven cars, robots como assistentes pessoais, ou produção descentralizada com base em impressoras 3D farão certamente parte corrente do nosso dia-a-dia.

A forma como consumimos, trabalhamos ou até como usufruímos dos momentos de lazer vão ser significativamente diferentes. Daqui a umas décadas os nossos sucessores vão olhar para os dias de hoje como nós olhamos para a vida dos nossos antepassados pré-históricos.

No que diz respeito às empresas nacionais, a transformação digital é já uma realidade?

Sem dúvida. Portugal evoluiu bastante nos últimos tempos e têm sido as empresas, mais que os consumidores, a ser o motor dessa evolução. Para exemplificar esta afirmação vejam-se os seguintes dados: embora Portugal ocupe lugares modestos na União Europeia em indicadores de consumo – número de utilizadores de internet (24º de 28), utilizadores de canal on-line bancário (24º) ou utilização de e-commerce (24º) – ao nível de indicadores empresariais apresentamos resultados francamente melhores – 6º em cobertura 4G, 2º em utilização de RFID, 9º ao nível de disponibilização de fatura eletrónica.

Adicionalmente, esta revolução digital é uma oportunidade relevante para Portugal se aproximar da linha da frente ao nível da competitividade das nações. Uma das características desta revolução digital é o facto de esbater fronteiras e tornar menos relevante a distância física, tornando os mercados cada vez mais globais (sejam de consumo, sejam de trabalho). Ou seja, será de todas as revoluções, aquela em que menos se farão sentir algumas das principais desvantagens que são cronicamente apontadas ao nosso País, nomeadamente o mercado reduzido e a posição de periferia na Europa.

entrevista-sergio-lee

TEDxPorto: novidades fresquinhas sobre a próxima edição

Se acredita que as ideias têm o poder de mudar atitudes, crenças e, consequentemente, o mundo; se é um fervoroso interessado na partilha, discussão e difusão do pensamento crítico; se está ansioso por mais uma edição do TEDxPorto, então temos novidades para si.

O E-Konomista sabe que o evento de 2019 realizar-se-á a 6 de abril e será (muito) especial, uma vez que será a 10ª edição do TEDxPorto. O local e tema ainda estão no segredo dos deuses, mas a organização promete trazer a palco um ou dois dos oradores mais impactantes de passadas edições. Quem será?

entrevista-sergio-lee