Catarina Milheiro
Catarina Milheiro
07 Mar, 2024 - 07:26

Aborto em Portugal: o que diz a lei?

Catarina Milheiro

Em Portugal, o aborto voluntário da gravidez pode ser realizado nas primeiras 10 semanas. Saiba mais sobre este tema.

Sabia que desde 2007, Portugal está entre os 72 países do mundo inteiro que legalizaram o aborto? Na verdade, desde este ano que o nosso país se posiciona juntamente com 71 países, que pertencem à Categoria V da escala criada pelo Center for Reproductive Rights (CRR) – uma escala que permite mapear a heterogeneidade de legislação do aborto no mundo.

Por isso mesmo, mediante solicitação, o aborto é permitido a todas as mulheres portuguesas sendo o limite de idade gestacional de 10 semanas.

Contudo, por se tratar de um país altamente religioso e com um forte vínculo às tradições, foi necessário fazer um longo percurso para se chegar à legislação atual. Fique connosco e saiba tudo sobre a interrupção voluntária da gravidez.

Um pouco sobre a história do aborto em Portugal

Apesar de este ser um tema controverso, é extremamente importante estarmos devidamente informados e percebermos as mudanças que se deram ao longo dos anos.

Até 1984 o aborto era considerado crime em Portugal – ou seja, era totalmente proibido. No entanto e partir desse mesmo ano, passou a ser permitido segundo a Categoria III da escala do CRR (apenas em casos específicos de necessidade à proteção física ou mental da mulher).

Apesar da grande vitória alcançada pelas mulheres portuguesas, houve quem continuasse na luta. E o resultado foi uma atualização na legislação, em 1997 – que alargou o prazo para interrupção da gravidez em casos de malformação fetal e/ou em situações de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual da mulher.

Contudo, a luta pela liberdade feminina continuou a ser debatida e em 2007 a lei portuguesa foi alterada novamente, após um Referendo Nacional. Na Lei n. º16/2007, foi incluída a possibilidade de se realizarem interrupções de gravidez em estabelecimentos de saúde oficiais ou oficialmente reconhecidos.

Em 2022, o número de abortos realizados em Portugal aumentou 15%.

Estima-se que foram realizados mais de 250 mil abortos legais em Portugal, desde 2007.

O aborto enquanto interrupção voluntária da gravidez

Um aborto consiste na interrupção da gravidez e pode ser espontâneo (quando acontece devido a uma ocorrência acidental ou de forma natural), ou induzido (isto é, quando a mulher opta por uma interrupção voluntária da gravidez).

Assim, depois de anos de luta para a melhoria dos direitos da mulher, atualmente em Portugal é possível realizar a interrupção voluntária da gravidez (IVG) – que é enquadrada pela Lei n.º 16/2007, de 17 de abril.

No nosso país, a interrupção voluntária da gravidez pode ser realizada nas primeiras 10 semanas de gravidez, calculadas a partir da data da última menstruação.

Para além disto, saiba que a lei dita que apenas a própria mulher pode pedir a mesma. No caso de ser psiquicamente incapaz ou menos de 16 anos, o seu representante legal poderá pedir a IVG.

E se se questiona se as mulheres imigrantes podem realizar uma IVG saiba que sim – têm exatamente os mesmos direitos de acesso à interrupção da gravidez, independentemente da situação legal.

As etapas do processo de IVG

A interrupção da gravidez só pode ser realizada por um médico e com o consentimento da mulher. Para além disto, o mesmo ocorre em várias fases:

  • 1ª fase: antes da interrupção da gravidez, existe uma consulta prévia, um período de reflexão de 3 dias e a possibilidade de consulta com psicólogo ou assistente social;
  • 2ª fase: interrupção da gravidez através da toma da 1ª dose de medicamentos e da toma da 2ª dose de medicamentos (cerca de 36/48 horas depois do primeiro medicamento);
  • 3ª fase: após a interrupção da gravidez há uma consulta médico de controlo – cerca de 15 dias depois da 1ª toma) e consulta de planeamento familiar.

Importa referir que, a IVG a pedido da mulher, pode ser realizada em estabelecimento de saúde oficiais ou oficialmente reconhecidos. Assim, para a marcação de consulta prévia, a mulher deve dirigir-se a um serviço de saúde – de preferência ao centro de saúde onde está inscrita.

Em caso de dúvida sobre as unidades de saúde na sua área de residência pode contactar o SNS 24 (808 24 24 24).

Um direito que não está ao alcance de todas as mulheres a nível mundial

Apesar de em Portugal a mulher ter conquistado este direito, a luta ainda continua em muitos países do mundo. Ou por questões religiosas, culturais ou éticas, em vários cantos do planeta os motivos para as mulheres continuarem a batalhar sobre um direito que é seu, podem ainda ser vários.

De facto e segundo os dados da ONU divulgados no estudo “Abortion Policies and Reproductive Health around the World”, em dois terços dos 195 países analisados em 2013, a interrupção da gravidez só é permitida quando a saúde (física ou psicológica) da mulher é ameaçada.

Por outro lado, em metade desses países o aborto é permitido quando a gravidez resulta de uma violação, incesto ou quando é comprovado que o feto possui uma má formação que pode colocar a vida da mulher em risco. E só um terço desses países tem em consideração a situação económica e social da mãe para permitir o aborto.

A verdade é que as políticas de aborto são mais restritivas na Oceânia, África e América Latina. Sendo que apenas 6% dos governos na Oceânia e 12% na América Latina, permitem a prática por pedido.

De facto, depois de enormes batalhas, Portugal conquistou um direito essencial para todas as mulheres. Contudo, há ainda muito trabalho a fazer no resto do Mundo onde as leis variam de país para país.

Veja também