Share the post "Canábis medicinal: Portugal é dos maiores produtores do mundo"
A canábis medicinal tem vindo a afirmar-se como uma alternativa terapêutica promissora para várias patologias, sendo alvo de crescente investigação científica e regulamentação legal.
Em Portugal, o enquadramento legal da sua utilização para fins medicinais desde 2018 posicionou o país como um dos líderes mundiais não só na produção, mas também no potencial clínico da planta.
O nosso país é atualmente o maior exportador europeu e o segundo maior exportador mundial de canábis medicinal, beneficiando de um enquadramento legal progressista, aliado a condições climáticas ideais para o cultivo da planta, o que atraiu numerosos investimentos estrangeiros.
Estima-se que mais de 25 toneladas de canábis sejam exportadas em 2025, com a Alemanha, Polónia, Reino Unido e Israel entre os principais destinos.
Apesar do sucesso na produção e exportação, o consumo interno permanece limitado. Ainda que existam diversos produtos autorizados, apenas um produto à base de flores secas foi disponibilizado nas farmácias, e o número de prescrições continua reduzido, em parte devido à pouca formação médica nesta área e à desinformação entre pacientes.
Canábis medicinal: as aplicações terapêuticas
A principal componente terapêutica da canábis reside nos seus canabinóides, especialmente o THC (tetrahidrocanabinol) e o CBD (canabidiol).
Ambos interagem com o sistema endocanabinóide humano, responsável pela regulação de funções como dor, humor, sono, apetite e inflamação.
As aplicações terapêuticas reconhecidas em Portugal são limitadas, mas sustentadas por evidência científica crescente.
De acordo com a Deliberação n.º 11/CD/2019 do INFARMED, a canábis medicinal pode ser prescrita quando os tratamentos convencionais não surtem efeito ou provocam efeitos adversos significativos. Saiba quais.
Espasticidade associada à esclerose múltipla
É uma das aplicações mais consensuais e estudadas. Os canabinóides, em particular a combinação THC/CBD, têm mostrado eficácia na redução da rigidez muscular, espasmos e dor, melhorando a qualidade de vida dos doentes.
Dor crónica (neuropática ou oncológica)
A canábis pode ser utilizada como adjuvante no tratamento da dor crónica, sobretudo quando associada a patologias como fibromialgia, neuropatias ou doenças degenerativas. Reduz a necessidade de opioides, minimizando riscos de dependência.
Náuseas e vómitos induzidos por quimioterapia
Canabinóides sintéticos como o dronabinol e o nabilona já eram utilizados noutros países há décadas. A canábis medicinal pode ser particularmente útil em doentes oncológicos, quando outros antieméticos falham.
Estimulação do apetite
Em doentes com VIH/SIDA ou submetidos a tratamentos oncológicos, a perda de apetite e o emagrecimento severo são frequentes. O THC demonstrou eficácia na promoção do apetite e na melhoria do bem-estar geral.
Síndromes epiléticas refratárias
Em algumas formas raras de epilepsia infantil, o CBD puro tem demonstrado significativa redução na frequência e intensidade das convulsões. O Epidiolex, por exemplo, é um medicamento aprovado em diversos países com esta finalidade.
Distúrbios do sono e ansiedade
Embora ainda não esteja oficialmente aprovado para estas indicações em Portugal, estudos sugerem que o CBD pode melhorar a qualidade do sono e reduzir a ansiedade, sem os efeitos colaterais típicos de benzodiazepinas ou antidepressivos.
O desafio da integração clínica
Apesar do potencial terapêutico, existem obstáculos à adoção mais generalizada da canábis medicinal no sistema de saúde português.
Entre os principais desafios estão a salta de formação específica dos profissionais de saúde, as barreiras legais e burocráticas à prescrição, o estigma cultural associado à planta ou a falta de diversidade de produtos autorizados pelo INFARMED.
Por isso, se bem que Portugal se destaca no panorama mundial como produtor e exportador de canábis medicinal, o mercado interno permanece aquém do potencial.
A canábis medicinal não é uma cura milagrosa, mas representa uma ferramenta terapêutica legítima e cada vez mais reconhecida. É uma alternativa segura e eficaz quando usada de forma adequada e sob orientação médica.
Breve história da canábis
Foi uma das primeiras plantas cultivadas pelo ser humano, inicialmente utilizada como fonte de fibras para o fabrico de tecidos e cordoaria a partir do seu caule. Posteriormente terá tido início a sua utilização para fins medicinais e espirituais, nomeadamente na medicina chinesa.
Apenas mais tarde foi introduzida na Europa, quer para fins de utilização recreativa, quer para fins medicinais, nomeadamente no tratamento de doenças infeciosas como o tétano, a raiva e a cólera, bem como no alívio da dor. Inicialmente, a canábis terá sido ilegalmente importada para os Estados Unidos da América a partir do México, sendo aprovado, no ano de 1937, uma lei que regulamentava a utilização da canábis medicinal.
Atualmente, as opiniões acerca da utilização da canábis continuam a ser controversas e contraditórias. Se, por um lado, há países que a consideram uma droga e a proíbem e criminalizam, outros caracterizam-na como uma droga leve autorizando o seu uso.