Share the post "Há uma fantástica aldeia de xisto que merece mesmo uma visita"
Há lugares que não se procuram propriamente no mapa, aquela aldeia de xisto que simplesmente aparece no caminho, quase como se alguém tivesse decidido pousá-la ali para testar a nossa capacidade de abrandar.
Cerdeira, perdida entre curvas de xisto e penedos que brilham quando o sol resolve ser generoso, é precisamente um desses sítios.
Um refúgio que não pede licença à pressa do mundo moderno, nem se deixa intimidar pela moda das viagens instantâneas. Fica onde sempre esteve, quieta, firme, um pouco teimosa até.
À primeira vista, a aldeia parece uma pequena composição em tons de castanho e verde.
Casas de xisto empoleiradas na encosta, ruas estreitas que obrigam o visitante a caminhar devagar (talvez seja essa a ideia desde o início), silêncio de fundo pontuado pela água que corre ribeiro abaixo.
A sensação é estranhamente familiar, como se o lugar tivesse memória própria e nos reconhecesse antes de nós o reconhecermos a ele.
E depois há aquele detalhe que muda tudo. Cerdeira não é apenas uma aldeia recuperada. É um espaço vivo dedicado à criação artística. Ateliers, residências, oficinas, programas culturais que brotam do xisto como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Cerdeira: aldeia de xisto, inspiração e criatividade
Curiosamente, a aldeia parece construída para ser cenário de histórias. Não só pelo que se vê, mas pelo que se adivinha.
O som das ferramentas nos ateliers, a luz que entra pelos vãos antigos, a forma como os artistas se movem entre as casas como se fizessem parte da paisagem desde sempre.
Quem chega por um fim de semana acaba por perceber rapidamente que este é daqueles lugares que se oferecem ao visitante mas exigem atenção em troca.
Alguns chamam-lhe uma “aldeia-galeria”. Outros preferem “laboratório de ideias”. Seja qual for a expressão, e há várias que assentam, o que importa é que aqui a arte não está fechada atrás de vitrines. Vive-se. Respira-se.
Surge na madeira entalhada a mão, na cerâmica ainda quente do forno, nas oficinas que recebem visitantes curiosos, sem pressa nem protocolo.
A Cerdeira Arts & Crafts School tornou-se uma das faces mais conhecidas desta identidade, mas a aldeia não se reduz ao projeto; pelo contrário, expande-se a partir dele.
Aldeia de xisto de Cerdeira: pequenas descobertas

Passear pelas ruas é, provavelmente, a atividade mais simples, e paradoxalmente, a mais marcante.
As casas foram recuperadas com rigor, mantendo o xisto exposto, como se cada parede quisesse contar a sua própria história. Em dias soalheiros, a luz transforma tudo num quadro. Em dias nublados, há um encanto mais íntimo, quase secreto.
Além dos ateliers, merece destaque o Espaço Cerdeira, onde se realizam exposições, conversas, performances e eventos que vão surgindo ao longo do ano sem anunciar demasiado, afinal, quem vem à serra sabe que parte da experiência é essa surpresa discreta.
E como a serra não deixa ninguém quieto durante muito tempo, é natural que o visitante acabe por seguir um dos trilhos que ligam a aldeia ao coração da Lousã. Há percursos marcados, subidas exigentes e miradouros que compensam qualquer esforço. Lugares onde o ar parece ter mais textura.
Passear na envolvente: Trevim e mais aldeias
A poucos quilómetros de Cerdeira encontra-se a vasta teia de trilhos e lugares emblemáticos da Serra da Lousã. O Alto do Trevim, por exemplo, guarda um dos horizontes mais amplos da região e em dias limpos, a vista vai tão longe que parece esticar a realidade.
As aldeias vizinhas de Talasnal, Casal Novo e Chiqueiro mantêm o mesmo espírito de pedra antiga, mas com personalidades completamente distintas.
Cada uma com o seu silêncio próprio, os seus gatos residentes e aquele encanto difícil de descrever sem soar exagerado.
E se a caminhada abrir o apetite, não faltam tasquinhas e pequenos restaurantes na subida para a Lousã, onde o mel, o queijo e os enchidos dão corpo à gastronomia serrana.
Chegar é simples, ficar é inevitável
Vindo do Porto, o caminho faz-se pela A1 até Coimbra e, depois, pela IC3 e N342 até à serra. Não é uma viagem longa, mas é daquelas que pede uma pausa pelo meio, nem que seja para perceber como a paisagem muda sem grande alarido.
De Lisboa, a rota segue pela A1 até Condeixa, repetindo depois o mesmo percurso em direção à Lousã. Duas horas e meia, mais coisa menos coisa, dependendo da pressa, embora a pressa seja precisamente aquilo que convém esquecer antes de chegar.