Alexandra Nunes
Alexandra Nunes
13 Mar, 2018 - 11:28

Cidade do Cabo prestes a ficar sem água: tudo sobre a ameaça do “Dia Zero”

Alexandra Nunes

A Cidade do Cabo está prestes a ser a primeira metrópole no mundo a ficar sem água. Descubra como vivem os residentes sul-africanos a ameaça do “Dia Zero”.

Cidade do Cabo prestes a ficar sem água: tudo sobre a ameaça do "Dia Zero"

Já lá vão 3 anos desde que a Cidade do Cabo, a segunda cidade mais populosa da África do Sul (4 milhões de habitantes) e onde vivem 22 mil portugueses, se debate com a seca. Nos últimos meses, os residentes têm feito de tudo para poupar água sob a ameaça de as torneiras serem fechadas muito em breve. Os esforços parecem estar a surtir efeito, já que o chamado “Dia Zero” foi adiado de Abril para Julho.

“Temos um balde no duche para aproveitarmos a água e usar para a sanita porque evitamos puxar o autoclismo, só mesmo quando necessário”, conta ao E-Konomista Filomena Gonçalves, uma portuguesa a viver há 5 anos na Cidade do Cabo. As campanhas de sensibilização para um consumo parcimonioso da água têm sido constantes e as autoridades apelam a que a população consuma um máximo de 50 litros de água por pessoa. Para ter uma ideia de quão restrito isto é, dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que, só num duche de cinco minutos, gastam-se cerca de 100 litros de água.

Poupar água tornou-se um hábito diário dos residentes. Filomena Gonçalves explica que são pequenos gestos que ajudam na poupança: “Fechamos a torneira quando lavamos os dentes, não tomamos duche todos os dias, não lavamos o carro. Começamos a aproveitar toda a água de cada vez que abrimos a torneira, como por exemplo, colocando um alguidar no lava-louça”.

O que acontece no “Dia Zero”

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Ryan Addison, natural da Cidade do Cabo, sublinha que “a população se sente triste pela falta de planeamento e visão das autoridades no que respeita à gestão dos recursos aquíferos da cidade”. O abastecimento de água da Cidade do Cabo está dependente quase em exclusivo das 6 barragens vizinhas.

A consecutiva falta de chuva tem feito as reservas de água descerem de tal forma que as autoridades sul-africanas viram-se obrigadas a decretar o estado de catástrofe natural em todo o país. O “Dia Zero” chegará quando o nível de água nas barragens atingir os 13,5% e o fornecimento normal de água tiver que ser interrompido.

A água das torneiras nas zonas residenciais será cortada. Nas áreas mais pobres não haverá um corte, mas a água irá correr com pressão reduzida. Nesse dia, a Cidade do Cabo será a primeira metrópole a nível mundial a ficar sem abastecimento de água.

Só o fornecimento a edifícios considerados essenciais, como escolas, hospitais ou bombeiros, é que se vai manter. A população poderá dirigir-se a um dos 200 postos de distribuição de água racionada, onde vai haver forte presença policial, mas cada pessoa tem direito a apenas 25 litros por dia. Como termo de comparação, em Portugal o consumo médio é superior a 200 litros diários.

Não admira, por isso, que a procura por água engarrafada tenha escalado. “Em Fevereiro, quando a divulgação por parte da Câmara começou a ser mais assertiva, começou a corrida aos garrafões de água. Os supermercados começaram a limitar o número de garrafões por pessoa e estes desapareciam rapidamente”, conta Filomena Gonçalves. Entretanto, a situação acalmou e “já voltou a haver água engarrafada em todo o lado”.

Turismo consciente

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Os apelos à poupança de água estendem-se também a quem visita a Cidade do Cabo. O turismo representa uma grande fatia da receita da metrópole. O município tem apostado forte nas companhas de sensibilização a turistas nas redes sociais usando os hashtags #savelikealocal (poupe como um local) e #whyweneedtourism (por que precisamos do turismo), que trazem duas listas com informações e esclarecimentos.

Mafalda Correia Machado visitou a Cidade do Cabo em Fevereiro e confirma ter recebido “muitas mensagens de alerta e sensibilização mesmo antes de lá estarmos hospedados.”. Os avisos para um consumo regrado da água “estavam por todo o lado”, desde o aeroporto a restaurantes. “Ao mesmo tempo notei uma preocupação com os turistas para não os afugentar”.

Mafalda veio deslumbrada com a cidade mas lamenta que os efeitos da seca já se notem na bonita paisagem: “Infelizmente, nota-se bem. Vi rios completamente vazios em viagens que fiz de carro à volta da cidade. Foi a minha primeira vez na Cidade do Cabo mas pareceu-me que estava tudo bastante mais árido e seco”.

Apesar do impacto visual, a falta de água não se traduziu em menos conforto durante a sua estadia. As piscinas estavam na mesma cheias e não havia nenhuma restrição específica no consumo de água.

O município da Cidade do Cabo está, entretanto, a estudar diferentes formas de obter água potável, como dessalinização da água do mar, recolha de água subterrânea e programas de reciclagem de água. O plano é encontrar alternativas antes do “Dia Zero” mas Ryan Addison está cético: “Eu diria que a par destas medidas os políticos estão ocupados é em rezar para que chova muito em breve!”

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