Teresa Campos
Teresa Campos
23 Abr, 2020 - 17:28

COVID-19 e nicotina: poderão os adesivos combater o coronavírus?

Teresa Campos

Um estudo francês analisa a relação entre a COVID-19 e a nicotina, sugerindo que esta substância pode reduzir o risco de infeção pelo novo coronavírus.

covid-19 e nicotina

Investigadores franceses estão a planear testar adesivos de nicotina em doentes com o novo coronavírus e em profissionais de saúde que estão na linha da frente deste combate. Isto, depois de um estudo ter sugerido que os fumadores podem correr menos risco de contrair uma infeção por este vírus. A questão está na possível relação entre COVID-19 e nicotina.

A pesquisa foi levada a cabo num grande hospital de Paris e sugere que existe uma substância no tabaco (provavelmente a nicotina) que pode evitar que os fumadores desenvolvam COVID-19. Ensaios e testes com adesivos de nicotina estão a aguardar a aprovação das autoridades de saúde francesas para avançarem.

Porém, os investigadores insistem que não estão a encorajar as pessoas a fumar, pois isso acarreta outros riscos para a saúde e mata 50% dos indivíduos que aderem a este vício. Se, por um lado, a nicotina pode proteger as pessoas deste vírus, os fumadores que contraiam o novo coronavírus desenvolvem, frequentemente, sintomas mais graves, devido ao efeito tóxico do fumo do tabaco nos pulmões. Perceba melhor esta possível relação entre COVID-19 e nicotina.

COVID-19 e nicotina: investigadores franceses testam adesivos de nicotina em doentes com o novo coronavírus

A equipa do hospital de Pitié-Salpêtrière avaliou 480 pacientes com COVID-19, dos quais 350 foram hospitalizados e os restantes (com sintomas mais leves) ficaram em casa. A pesquisa concluiu que os doentes hospitalizados tinham uma média de 65 anos de idade e só 4.4% eram fumadores regulares. Já os que recuperaram em casa tinham uma média de idade de 44 anos e 5.3% eram fumadores.

Considerando a idade e o género dos pacientes, os investigadores concluíram que o número de fumadores era muito inferior ao estimado para a população em geral pela autoridade de saúde francesa (Santé Publique France), cujas estimativas rondavam os 40% para os indivíduos entre os 44 e os 53 anos e os 8.8% a 11.3% para aqueles entre os 65 e os 75 anos.

Mulher com adesivo de nicotina

A opinião do neurobiólogo Jean-Pierre Changeux

O reconhecido neurobiólogo francês, Jean-Pierre Changeux, reviu este estudo e sugeriu que a nicotina pode impedir o novo coronavírus de chegar às células do corpo, evitando a sua propagação. De acordo com o especialista, a nicotina também pode atenuar a reação exacerbada do sistema imunitário, comum nos casos mais graves de COVID-19.

As conclusões são retiradas de um estudo clínico em que serão colocados adesivos de nicotina a profissionais de saúde na linha da frente do combate à COVID-19, a doentes hospitalizados com o novo coronavírus e a pacientes nos cuidados intensivos.

Um estudo chinês

Estas previsões vão ao encontro de um estudo chinês publicado no final de março no New England Journal of Medicine. Essa pesquisa sugeria que só 12.6% das 1000 pessoas infetadas com o novo coronavírus eram fumadoras, enquanto o número de fumadores na China ronda os 28%.

O caso francês

Em França, os dados dos hospitais parisienses mostram que dos 11000 pacientes admitidos no hospital com COVID-19, 8.5% eram fumadores. Já o número total de fumadores em França estima-se que ronde os 25.4%.

Os autores do estudo levado a cabo no hospital Pitié-Salpêtrière indicam que há, efetivamente, evidência de que quem fuma tem menor probabilidade de desenvolver sintomas ou mesmo uma infeção grave, devido ao novo coronavírus, do que os não fumadores.

risco do tabaco na COVID-19
Veja também COVID-19 e tabaco: fumar pode aumentar o risco de infeção

Outros estudos a considerar

Porém, neste momento, há também que recordar outros estudos já realizados e que podem, de algum modo, confrontar as teses aqui apresentadas. Por exemplo, na China, os investigadores concluíram que a taxa de mortalidade entre os homens foi de 2.8%, em comparação com 1.7% nas mulheres.

Entre as várias razões apresentadas como possíveis para esta discrepância de números pode estar o facto da China ter cerca de 316 milhões de fumadores, dos quais apenas 2% são mulheres.

Assim, há também outros números a considerar.

Um estudo com 78 pacientes com COVID-19, publicado no Chinese Medical Journal, concluiu que aqueles que tinham historial como fumadores estavam 14 vezes mais suscetíveis a desenvolver pneumonia e a morrer do que os não-fumadores ou do que aqueles que nunca fumaram.

Um relatório analisou 1.099 casos positivos de COVID-19 na China e concluiu que 12.4% dos fumadores ou morreu, ou precisou de cuidados intensivos ou necessitou de entubação, em contraste com 4.7% dos não-fumadores.

A Organização Mundial de Saúde também já admitiu a possibilidade dos fumadores estarem mais suscetíveis a complicações graves, em situação de infeção pela COVID-19.

fumador com máscara

Em suma

Para já, encontramo-nos numa fase exploratória e em que todos os estudos são válidos e um ponto de partida para ficar a saber mais sobre o novo coronavírus e a sua forma de prevenção e combate.

Contudo, convém sublinhar que mesmo que as suspeitas deste estudo se confirmem, ele não incentiva de modo algum as pessoas a fumarem, daí a experiência fazer uso de adesivos de nicotina e não de cigarros, propriamente ditos.

Assim, se é fumador, deve continuar a tentar deixar esse vício, de forma a melhorar a sua saúde e o bem-estar do seu organismo, de uma forma geral.

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