O Governo está preparar uma alteração profunda ao regime de despedimento por justa causa.
No seu anteprojeto de revisão do Código do Trabalho, o Executivo de Luís Montenegro pretende que as micro, pequenas e médias empresas (empresas com menos de 250 trabalhadores, que representam cerca de 99 % do tecido empresarial português) poderão avançar com despedimentos por justa causa baseados em factos imputáveis ao trabalhador sem apresentar provas exigidas por este nem ouvir testemunhas por si indicadas no âmbito do processo disciplinar.
Atualmente, a lei exige que o empregador comunique a intenção de despedimento, apresente uma nota de culpa e conduza diligências probatórias solicitadas pelo trabalhador, incluindo a audição de até 10 testemunhas (três por cada facto relevante), além de submeter o processo à comissão de trabalhadores ou sindicato.
A nova proposta elimina parte significativa desse procedimento para o segmento empresarial da micro à média empresa, mantendo o acesso às garantias processuais apenas para as grandes empresas.
Os sindicatos já anunciaram um rotundo não a estas intenções do Governo.
Despedimento por justa causa: riscos legais
Especialistas em direito laboral alertam que esta alteração pode violar o direito à defesa, já que retira as garantias mínimas previstas no processo disciplinar, uma norma que já tinha sido, anteriormente, considerada inconstitucional.
O anteprojeto ainda será objeto de discussão na Concertação Social e posteriormente seguirá para o Parlamento, onde poderá ser ajustado ou rejeitado.
Mais mudanças
Além da alteração relativa ao despedimento por justa causa, o Governo está a propor um conjunto amplo de mudanças (mais de 100 artigos do Código do Trabalho) com o objetivo de tornar o mercado de trabalho mais flexível e adaptado aos desafios do século XXI. Conheça as principais medidas que estão em cima da mesa.
Contratos a termo
- Duração inicial passa de 6 meses para 1 ano;
- Duração máxima com renovações aumenta de 2 para 3 anos para contratos certos e de 4 para 5 anos para incertos;
- Alargamento da admissibilidade de contratos a termo certo a empresas de qualquer dimensão nos primeiros dois anos de atividade e a reformados ou pessoas sem experiência anterior.
Banco de horas individual
- Retorno do regime, mediante acordo, com até 2 horas diárias extras, limite semanal de 50 horas e máximo de 150 horas anuais, sendo possível sua instituição via convenção coletiva.
Férias compradas
- Trabalhadores poderão adquirir até 2 dias de férias extra por ano, suportando a perda salarial correspondente, mas sem impacto em subsídios ou contributivos.
Pagamento em duodécimos
- Trabalhadores poderão escolher receber os subsídios de férias e de Natal de forma fracionada ao longo de 12 meses ou normalmente em duas parcelas.
Teletrabalho
- Mais flexibilidade para o empregador recusar propostas ou impor condições. As regras serão também estendidas a outras formas de trabalho à distância.
Saídas do período experimental
- Revogação do período experimental obrigatório de 180 dias para quem procura o primeiro emprego ou para desempregados de longa duração.
Serviços mínimos alargados em greve
- Garantia de serviços mínimos em vários setores essenciais, incluindo creches, lares, abastecimento alimentar e segurança privada.
Fim das restrições ao outsourcing
- Revogada a limitação que impedia o recurso a outsourcing no ano seguinte a despedimentos coletivos ou por extinção de posto de trabalho.
Quotas para pessoas com defeciência
- Redução do grau mínimo de incapacidade de 60% para 33% para efeitos de quotas obrigatórias de emprego.
Trabalhadores independentes
- Elevação do limiar de dependência económica de 50% para 80%, para reconhecimento de vínculo empregatício.
Plataformas digitais
- Transposição de diretiva europeia para melhorar condições e proteção de dados no trabalho via plataformas, com critérios de regularidade e dependência económica.
Trabalho não declarado
- Possível revogação das penas de prisão por trabalho não declarado, tornando-o apenas contraordenação.