Share the post "Governo aprova novas medidas para combater crise na habitação"
Num momento em que o debate sobre o acesso à habitação e os custos com rendas se tornou central no quotidiano de milhares de famílias em Portugal, o Governo apresentou um conjunto ambicioso de medidas que pretendem acelerar soluções e provocar um choque no mercado imobiliário.
Entre cortes fiscais, incentivos à reabilitação e ajustamentos no IMT para não residentes, as propostas visam responder a um problema crónico, ou seja, tornar a habitação mais acessível sem descurar os agentes do setor.
Na conferência de imprensa após o Conselho de Ministros, o primeiro-ministro Luís Montenegro deixou claro que se pretende “abanar o mercado”. E elencou uma série de medidas para impulsionar este segmento do mercado.
- Redução do IVA para 6 %. Aplica-se à construção e reabilitação de edifícios quando destinem habitação para arrendar, até rendas de 2.300 €/mês, e também à construção para venda até um montante de 648 mil euros.
- Agravamento do IMT para compradores não residentes. Quem não resida em Portugal e pretenda adquirir habitação verá este imposto aumentar. Os emigrantes ficam, no entanto, excluídos desta agravante.
- Fiscalidade sobre contratos de arrendamento moderado. O Governo vai reduzir a taxa de IRS aplicada aos contratos de arrendamento de habitações com rendas moderadas de 25 % para 10%.
- Aumento das deduções à coleta para inquilinos. Um incentivo direto para aliviar o peso fiscal de quem vive em habitação arrendada.
- Eliminação do teto máximo de 2 % de aumento das rendas para novos contratos quando a habitação já estava no mercado de arrendamento nos últimos cinco anos e as rendas forem superiores ao previsto no Programa de Apoio ao Arrendamento.
- Isenção de mais-valias de IRS se reinvestidas em imóveis para arrendamento a valor moderado. Quem vender uma casa e aplicar o valor num imóvel destinado a arrendamento terá tratamento fiscal mais favorável.
- Simplificação dos processos de licenciamento. O Governo pretende reduzir controlos prévios e acelerar os trâmites no regime jurídico da urbanização e edificação.
Estas medidas compõem um pacote que procura atacar o problema da habitação em múltiplas frentes (oferta, fiscalidade, incentivos e burocracia) com ambição e urgência. Mas a sua eficácia dependerá da articulação e da execução.
Habitação: esperanças e riscos
As medidas apresentadas tocam pontos sensíveis de uma crise estruturada. Há décadas que muitos dos problemas do mercado habitacional português se arrastam, como a escassez de oferta, a valorização especulativa do solo, os condicionalismos regulatórios e elevados custos de materiais e construção.
A redução do IVA para 6 % em obras de construção ou reabilitação com vocação para arrendamento pode significar um alívio substancial para promotores e investidores dispostos a apostar no mercado de aluguer.
Se bem implementada, esta medida poderá fomentar novos projetos habitacionais, especialmente em zonas de alta pressão imobiliária como Lisboa ou Porto.
Por outro lado, o agravamento do IMT a compradores estrangeiros (com exclusão dos emigrantes) tenta conter fenómenos de “turismo imobiliário especulativo” que pressionam os preços locais, sobretudo em áreas costeiras e nos grandes centros urbanos.
A redução do IRS nos contratos de arrendamento moderado pode tornar mais interessante para o proprietário optar por este regime, o que teoricamente reforça a oferta de habitação a preços “mais justos”. As deduções adicionais aos inquilinos também visam aliviar o custo mensal vivido no bolso de muitas famílias.
Mas, claro, há aspetos que exigem vigilância atenta. Quais são os principais?
- Critérios e limites bem definidos. A “renda moderada” ou os limites para aplicar IVA a 6 % têm de estar bem desenhados para que não fiquem lacunas ou abusos.
- Capacidade institucional. Simplificar processos de licenciamento implica que câmaras municipais e entidades reguladoras consigam dar resposta rápida sem perda de rigor.
- Impacto no mercado livre. Essas medidas podem alterar incentivos no mercado livre de habitação, com potenciais consequências indesejadas, como fuga de oferta ao mercado arrendatário ou desequilíbrios regionais.
- Equilíbrio financeiro das contas públicas. Reduções fiscais e isenções implicam menor receita estatal, pelo que é necessário garantir que não comprometam a sustentabilidade orçamental.
O que muda para cidadãos e investidores?
Para o cidadão que vive de renda mensal, estas medidas poderão trazer dois efeitos tangíveis: menor carga tributária direta e alguma proteção adicional.
As deduções acrescidas para inquilinos e o teto mais flexível no aumento de rendas favorecem quem já suporta o custo mensal elevado. Se mais proprietários optarem por contratos de “arrendamento moderado”, haverá mais oferta acessível.
Para quem quer investir no setor imobiliário ou construir para arrendar, a medida do IVA reduzido melhora a viabilidade económica dos projetos, especialmente aqueles que visam faixas de mercado mais acessíveis. O risco regulatório também pode ser menor se os critérios forem claros.
Já para o mercado especulativo ou comprador estrangeiro, há um sinal claro de contenção, ou seja, mais impostos para desencorajar aquisições puramente financeiras que pressionem os preços locais.
O desafio agora é transformar intenções em resultados concretos e assegurar que as políticas funcionem no terreno, evitar a morosidade burocrática e monitorizar o efeito real nas grandes cidades, nas zonas periféricas e no interior do país.