Share the post "Herança indivisa: cada herdeiro deve declarar a sua renda no IRS"
Quando alguém morre e deixa um imóvel, é muito comum que esse bem passe para vários herdeiros ao mesmo tempo. Enquanto não há partilhas feitas em escritura ou registo, estamos perante uma herança indivisa, ou seja, o bem pertence a todos em conjunto, sem divisão concreta por cabeça.
Se esse imóvel está arrendado e a gerar rendas, essas rendas não “ficam no limbo” para efeitos fiscais. Têm de ser declaradas em IRS pelos herdeiros.
A Autoridade Tributária (AT) entende que os herdeiros devem declarar no IRS a sua parte das rendas obtidas por imóveis incluídos em herança indivisa, mesmo que o dinheiro esteja numa conta da herança ou centralizado num só herdeiro.
O que conta para o fisco é que o rendimento existe e é imputável àqueles titulares, não o facto de já ter sido repartido ou não.
Herança indivisa: cada herdeiro tem a sua quota
A regra é que a herança indivisa é tratada como uma situação de compropriedade. Ou seja, cada herdeiro é considerado titular de uma quota ideal do imóvel e, por isso, da mesma quota das rendas geradas.
Se nada diferente tiver sido acordado ou formalizado, presume-se que as quotas são iguais. Três herdeiros, três partes iguais. Quatro herdeiros, quatro partes iguais. E assim sucessivamente.
Do ponto de vista prático, as rendas de um imóvel arrendado através da herança indivisa são enquadradas como rendimentos prediais, o que significa que vão para o Anexo F da declaração Modelo 3 de IRS, como qualquer outra renda de casa arrendada.
A diferença está na forma como se reparte o rendimento. Em vez de um único titular declarar 100%, cada herdeiro declara apenas a percentagem que lhe cabe.
Herança não é tributada
Importa também lembrar que não é a herança, em si, que é tributada em IRS. O que paga imposto são os rendimentos que essa herança gera, como rendas, juros ou mais-valias.
Se o imóvel herdado estiver vazio e não gerar qualquer rendimento, não há rendimentos prediais a declarar por causa disso. A herança pode ter outras implicações fiscais (como selo), mas isso é outro assunto.
Onde as coisas começam a complicar-se é quando há um herdeiro que “toma conta de tudo”, ou seja, recebe as rendas, gere o imóvel, paga obras, seguros, IMI, e os restantes quase nem sabem quanto entra ou sai.
Fiscalmente, porém, para a AT se existe herança indivisa, se existe imóvel arrendado, logo todos os herdeiros são chamados a declarar a sua parte. Se não o fizerem, arriscam divergências entre o que o fisco vê (através de cruzamento de dados) e o que foi declarado.
Para evitar problemas, convém que os herdeiros tenham contas minimamente claras entre si, designadamente saber quanto o imóvel rende por ano, que percentagem cabe a cada um e como isso deve aparecer no IRS de cada agregado. E, idealmente, que isso esteja alinhado com a forma como a renda é gerida na prática.
Guia: como declarar rendas de herança indivisa no IRS

Deixamos-lhe aqui um guia passo a passo, para que saiba como deve proceder para declarar no IRS rendas de uma herança indivisa.
Confirmar se há herança indivisa com rendas
Antes de mais, importa perceber em que situação está. Houve óbito, há bens ainda sem partilhas concluídas? Existe pelo menos um imóvel arrendado que fazia ou passou a fazer parte da herança?
Se a resposta for sim às duas perguntas, está perante uma herança indivisa com rendimentos prediais.
Determinar herdeiros e quotas
Identifique todos os herdeiros com direito à herança (cônjuge, filhos, etc.) e confirme se existe algum documento (escritura de habilitação de herdeiros, acordo, testamento) que defina quotas diferentes.
Se nada estiver definido, parte-se da presunção de quotas iguais entre todos.
Apurar valor total das rendas do ano
Some o total das rendas recebidas pelo imóvel da herança no ano a que respeita a declaração de IRS. Considere o valor bruto (antes de retenções e despesas) e se houver mais do que um imóvel arrendado na herança, trata cada contrato de arrendamento como um prédio distinto.
Esse valor total é a base que depois vai repartir.
Calcular a quota de cada herdeiro
Agora faça as contas ao valor a inscrever no seu IRS. Por exemplo, se são 3 herdeiros com quotas iguais e o imóvel rendeu 9 000 €, cada um declara 3 000 €.
Se um herdeiro tem 50% e outros dois têm 25% cada, e o total foi 8 000€, então, o herdeiro A declara 4 000€, o herdeiro B declara 2 000€ e o herdeiro C declara 2 000€.
Preencher o Modelo 3/Anexo F
Na declaração de IRS (Modelo 3), cada herdeiro deve adicionar o Anexo F (Rendimentos Prediais) e identificar o imóvel arrendado (matriz, localização, etc.), tal como em qualquer renda de casa.
Deve ainda indicar o valor da renda anual correspondente apenas à sua quota-parte.nQuando a declaração assim o permitir, assinalar que se trata de compropriedade/herança indivisa e preencher a percentagem de titularidade.
A estrutura exacta dos campos pode variar ligeiramente de ano para ano, por isso convém seguir as instruções do próprio anexo ou recorrer a apoio de um contabilista quando existirem mais do que um imóvel ou quotas diferentes entre herdeiros.
Registar despesas dedutíveis (se aplicável)
Se houver despesas associadas ao imóvel que possam ser deduzidas (como obras, condomínio, IMI, seguro obrigatório), estas também devem ser imputadas em função da quota de cada herdeiro.
Tal como com as rendas, ninguém deduz 100% sozinho se é apenas comproprietário.
Validar a coerência entre herdeiros
Idealmente, todos os herdeiros devem usar o mesmo valor total de rendas como referência e declarar percentagens que somem 100%.
Se um declarar mais ou outro menos, o cruzamento de dados da AT pode detectar inconsistências.
Guardar documentação de suporte
Fique com tudo organizado, desde contratos de arrendamento a comprovativos de recebimento das rendas, passando por documentos da herança (habilitação de herdeiros ou certidões) ou faturas de despesas associadas ao imóvel.
Se a AT pedir esclarecimentos, é isto que vai precisar de apresentar.
Peça ajuda
Se a situação envolver muitos herdeiros, vários imóveis ou acordos complexos, é sensato pedir apoio a um contabilista certificado ou a um técnico oficial de contas.