Miguel Pinto
Miguel Pinto
14 Jul, 2025 - 17:00

Humanos a falar com animais de estimação? IA diz que é possível

Miguel Pinto

A inteligência artificial pode vir a dar uma ajuda e permitir a humanos falar com animais de estimação. E já está a ser estudado.

Londres acaba de dar o primeiro passo oficial para algo que parece saído de um filme da Disney com toque de ficção científica: usar inteligência artificial para traduzir o que os animais de companhia estão a tentar comunicar. Ou seja, colocar humanos a falar com animais de estimação.

A partir de setembro, a prestigiada London School of Economics (LSE) inaugura o Jeremy Coller Centre for Animal Sentience, um centro pioneiro que irá explorar como a IA pode ajudar-nos a compreender (e quem sabe um dia “conversar”) com os nossos companheiros de quatro patas.

Com um financiamento inicial de 4 milhões de libras, o centro vai reunir especialistas de áreas tão diversas como a neurociência, filosofia, ciência computacional, psicologia e direito.

Tudo para investigar um tema que até agora pertencia mais ao domínio da curiosidade do que da ciência aplicada: a consciência e comunicação animal.

Tradutores de miados, latidos e ronrons?

O projeto mais ambicioso (e provavelmente o mais aguardado pelos donos de animais) é o desenvolvimento de ferramentas de IA capazes de interpretar sinais comportamentais e vocais emitidos por cães, gatos e outros animais domésticos.

O objetivo? Criar aplicações que permitam aos humanos “traduzir” emoções, necessidades ou estados de espírito dos seus animais com base em dados comportamentais, padrões vocais e linguagem corporal.

“Podemos imaginar um futuro em que os donos saibam com mais precisão se o seu cão está com dor, ansioso ou apenas quer brincar. Mas há uma diferença entre interpretar sinais e projetar neles emoções humanas”, alerta o professor Jonathan Birch, diretor do novo centro, citado pelo jornal britânico The Guardian.

Os riscos da antropomorfização

Embora as possibilidades tecnológicas entusiasmem, os investigadores sublinham os perigos de confiar cegamente na IA para “traduzir” sentimentos animais.

Uma app que diga que o seu gato está feliz pode ser reconfortante, mas também pode estar completamente errada.

“A IA pode produzir interpretações emocionalmente apelativas mas enganadoras”, diz Birch. “Precisamos de diretrizes éticas claras para evitar que esta tecnologia crie uma ilusão de comunicação, com potenciais impactos negativos no bem-estar animal.”

Este é, de resto, um dos objetivos centrais do centro: desenvolver quadros normativos e legais para garantir que as ferramentas desenvolvidas respeitam a realidade dos animais, em vez de simplesmente reforçar projeções humanas.

Para lá de cães e gatos

O novo centro não se vai limitar a estudar animais domésticos.

Entre as áreas de investigação conta-se também o bem-estar animal na agricultura e como a automação está a moldar (ou a eliminar) relações humanas com os animais ou a inteligência e sensibilidade de espécies como polvos, lulas ou caranguejos, cada vez mais reconhecidos como seres conscientes.

A forma como veículos autónomos devem tomar decisões éticas quando se deparam com animais na estrada, um problema que, até agora, tem ficado fora da maioria dos debates sobre IA, será outra das áreas em análise.

Entre ciência e empatia

Mais do que criar gadgets para tutores curiosos, ou colocar os humanos a falar com animais, o Jeremy Coller Centre quer provocar uma mudança mais profunda e que passa por repensar a forma como os vemos e tratamos.

Ao reconhecer níveis de consciência e capacidade de sofrimento em várias espécies, a sociedade pode, e deve, adaptar as suas políticas, leis e comportamentos.

“A tecnologia pode ser uma ponte, mas não substitui a empatia”, afirma Birch. “O nosso trabalho é garantir que as ferramentas digitais que construímos aproximam-nos da verdade animal e não apenas do que gostávamos de ouvir.”

Se conseguir cumprir o que promete, este centro poderá marcar o início de uma nova era. Aquela em que deixamos de ser os únicos protagonistas do discurso e aprendemos, finalmente, a ouvir.

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