Valdemar Jorge
Valdemar Jorge
27 Nov, 2020 - 17:10

Fiat 600: um sucesso de 14 anos que culminou no Seicento

Valdemar Jorge

O Fiat 600 não foi tão popular como o “irmão” mais novo: o 500. Mesmo assim, a sua história é rica e termina no contemporâneo Seicento.

fiat 600 estacionado

O Fiat 600, irmão mais velho do conhecido Fiat 500, deu origem ao Múltipla (recuperado nos finais de 1990), que marcou o primórdio dos MPV na marca italiana.

2020 marca o 65.º aniversário do início da comercialização do Fiat 600, que durante 14 anos (1955 – 1969), brilhou no firmamento da marca italiana. Não teve o sucesso do “irmão” mais novo o 500, que na geração atual abraçou o novo paradigma e pode ser encontrado com motor a combustão (gasolina e diesel), ou propulsor elétrico, mais adequado às atuais exigências da mobilidade nas cidades.

Não se pense que o Fiat 600 foi um modelo desinteressante. Longe disso. Marcou uma época, serviu uma geração e catapultou o seu nome até aos anos 2010, quando a designação Seicento foi recuperada pela Fiat em 1998, para fazer reviver o citadino.

Nesta altura, apresentou-se como um automóvel moderno, com design elegante, que veio substituir o Cinquecento. Tal como os seus antecessores o Seicento foi construído na fábrica da Fiat em Tychy, na Polónia, de onde saíram para o mercado global 1.328.973 exemplares.

Como curiosidade refira-se que o nome Seicento tem origem na palavra italiana ‘600’ e, de alguma maneira, é sucessor em espírito do Fiat 600. Seicento que foi rebatizado como ‘60’ para assinalar o 50.º aniversário do modelo original.

Fiat 600: história e concorrência

Dez anos passados sobre o final da Segunda Guerra Mundial, a Itália, bem como toda a Europa fervilhava. A recuperação económica era uma realidade e a procura por automóveis era muita. As marcas adaptavam-se e procuravam dar resposta à imensa procura.

Após o conflito militar, que entre 1939 e 1945 envolveu a maioria das nações do mundo, incluindo todas as grandes potências, marcas como a Renault e Citroën apressaram-se a desenvolver os primeiros automóveis que conquistaram assinalável sucesso. Falamos do Renault 4CV (1946) e do Citroën 2CV (1948).

Na altura a Fiat respondeu com o conhecido 500 que, embora tenha “nascido” em 1936, foi recolocado no mercado após a guerra.

Mas, no dealbar dos anos 50, intensificou-se a procura por automóveis que proporcionassem mais espaço, ainda que a Fiat fosse, na altura o segundo maior fabricante presente na Europa, registando mais de 40 mil unidades do 500 vendidas.

Fiat 600 chegou em 1955

Ciente das especificidades do mercado a Fiat apresentou o modelo 600 em 1955, no Salão Automóvel de Genebra.

O projeto com assinatura do engenheiro Dante Giacosa (1905-1996) chamou a atenção não só pelas linhas curvas (a denunciar alguma inspiração no bem sucedido Volkswagen Carocha, principalmente na secção traseira), mas, também, por no lançamento, em Genebra, a Fiat mostrar o carro cortado ao meio (girando numa plataforma) mostrando, assim, a nova conceção mecânica, que destacava o motor na traseira da viatura.

Outras caraterísticas que chamaram de imediato a atenção foi a abertura das portas (suicidas), a ampla superfície vidrada, a permitir boa visibilidade, e um habitáculo simples onde se destacava o quadro de instrumentos e luzes-piloto. O volante era grande e tinha dois raios.

Versatilidade já era uma realidade

A Fiat com o 600 implementou ainda um conjunto de novidades que tornavam o automóvel mais versátil. Eram elas a possibilidade de reclinar os bancos dianteiros e de rebater o banco traseiro o que aumentava a versatilidade do habitáculo.

Outra novidade que o Fiat 600 introduziu foi a dupla utilização do calor emanado pelo radiador do motor: no desembaciamento do para-brisas e, também, para aquecer o automóvel no inverno. Inteligente.

Mecanicamente, o Fiat 600 era animado por bloco de quatro cilindros em linha e refrigeração a água. Velocidade máxima anunciada de 95 km/h e consumo moderado, sendo possível percorrer 17 km com um litro de combustível.

A suspensão era independente nas quatro rodas e os travões de tambor. O tanque de combustível tinha capacidade para 27 litros e o peso do conjunto era de 585 kg. Um peso pluma.

Sucesso leva à criação de novas variantes de carroçaria

Logo após a apresentação do Fiat 600 os ecos que se fizeram sentir foram muito positivos para a marca italiana. O público adorou as soluções do compacto e a Fiat para dar resposta à procura produzia 624 unidades por dia na fábrica de Mirafiori, mas nos dois anos seguintes subiu para 839 exemplares, tal era a procura.

No primeiro ano a marca comercializou cerca de 300 mil exemplares sendo que o preço de 590 mil liras e planos de pagamento até 24 meses ajudaram sobremaneira ao sucesso.

Em 1956 a marca sente necessidade de inovar de novo. Coloca no mercado versão do Fiat 600 com teto em lona, altera os vidros das portas que passam de corrediços para descendentes e, para conquistar ainda mais mercado, principalmente o familiar, apresenta uma minivan compacta a que chamou Multipla.

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Fiat 600 pioneiro no segmento das minivan com o Multipla

A agradabilidade do modelo, como já dissemos, era imensa. A exigência do mercado e a necessidade de apresentar soluções efetivas para famílias ditaram que o 600 fosse pioneiro no segmento das minivan com a variante Multipla.

Trata-se de uma proposta que antevê o que hoje chamamos de SUV compacto. O design do Multipla, maior que o Fiat 600, era fruto do cruzamento de uma frente quase plana com a secção traseira do 600.

Os bancos da frente estavam colocados quase sobre o eixo; as portas mantinham-se “suicidas” enquanto que as portas traseiras abriam de forma “normal”.

Espaço era palavra de ordem no Multipla e foi o que Dante Giacosa implementou no seu design. Todo o habitáculo foi puxado para a frente libertando espaço para o motor traseiro e para a colocação de carga.

Este Multipla levava até seis passageiros em três filas de bancos (2+2+2) sendo que as duas filas (central e traseira) quando rebatidas deixavam o piso totalmente plano, facto muito apreciado para o transporte de carga.

Estranha forma de condução não impediu sucesso

Ao ser apresentado em 1956 no Salão Automóvel de Bruxelas o Multipla inovou não só no formato, mas na configuração do habitáculo. As duas filas de bancos traseiras quando rebatidas formavam o que se pode chamar de cama, apelando ao descanso em viagens de longo curso.

Estranha para alguns utilizadores era a posição do condutor que tinha a coluna de direção entre as pernas e o passageiro tinha de conviver, no seu espaço, com a roda suplente.

A performance do Multipla que derivava do Fiat 600 era consentânea com o que prometia. Velocidade máxima de 90 km/h e baixo consumo. Com um litro de combustível percorria cerca de 15 km/h.

Para além da performance como automóvel de família, o Multipla foi procurado para desempenho comercial e, muito bem aceite como Táxi, devido ao conforto e espaço proporcionado.

O Multipla acabou por ser substituído pelo Fiat 850 Familiare. Entretanto, nome Multipla foi reintroduzido pela Fiat no final de 1990. A sua forma estranha é uma evolução do original. Mantém o espaço quer para passageiros (até 6 em duas filas de bancos (3+3) e bagagens.

A produção deste modelo desenhado por Roberto Giolito decorreu entre 1998 e 2010.

Fiat 600 inspirou muitas variantes

De volta ao Fiat 600, hoje tornado um clássico, não podemos esquecer a evolução que conheceu em 1964 fruto da proibição das portas “suicidas” em Itália. Deste modo, a Fiat arregaçou mangas e reinventou o 600 colocando no mercado um automóvel mais elegante e atraente.

Só em 1969 o modelo conheceu a suspensão de produção numa altura em que circulavam pelo mundo qualquer coisa como 2,6 milhões de unidades. O seu sucessor foi o Fiat 850, outro modelo que conheceu grande sucesso em Itália e na Europa.

A concluir, sublinhar que o Fiat 600 conheceu diversas variantes sendo um dos automóveis italianos que mais inspirou carroçadores por essa Europa fora.

São exemplo os modelos:

  • 600 Jungle (1955), jipe da Carrozzeria Savio;
  • Berlinetta (1956), da Carrozeria Accossato;
  • 600 Cabrio (1956), da Flua;
  • Coupé (1957), da Fissore;
  • Coupé (1957), da Fissore;
  • 600 Spyder (1958), da Sieta;
  • 600 Giardinetta (1958), da Viotti;
  • Jolly (1958) formato de buggy;
  • 600 Rendez Vous (1959), da Vignale;
  • Berlineta (1959) do estúdio Pininfarina;
  • 600 Lucciola (1959), da autoria de Francis Lombardi;
  • 600 Y Aerodinamica (1961), do estúdio Pininfarina.

Sucesso também no desporto

No mundo do desporto o Fiat 600 também brilhou com propostas 1000 TC; 850 TCR e 1000 TCR com potências até 90 cv, desenvolvidas até 1970 e que competiram com sucesso nas classes desportivas com cilindrada até 1000 centímetros cúbicos.

Mais arrojadas, em termos estéticos, foram as propostas que apresentavam a assinatura da Abarth, hoje verdadeiro ícone da preparação de automóveis para competição.

Dos modelos que preparou à época destacou-se a versão 750, em 1956, desenvolvida com potências entre 41 a 50 cv, com velocidade máxima de 150 km/h, na versão mais potente.

A evolução do modelo ditou que em 1960 surgisse o modelo 850 TC com motor de 1000 cc – Turismo Competizione e, no ano seguinte. O 1000 Berlina com  motorização de 1,0 litro.

O Fiat 600 constitui mais um modelo de sucesso da marca italiana que conquistou a Itália e a Europa. Além de cobiçado clássico é ainda precursor de um dos segmentos com maior expansão na atualidade: o dos SUV.

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