Miguel Pinto
Miguel Pinto
18 Dez, 2025 - 16:00

900 quilómetros, 12 aldeias e séculos de histórias: eis a GR22

Miguel Pinto

O nome correto é Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal, mas é mais conhecida pela GR22. Um percurso a não perder.

Sortelha na rota da GR22

O que torna a GR22, Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal, tão distinta não é apenas a extensão ou o facto de ligar doze aldeias que parecem suspensas no tempo. É a forma como a rota se entranha na própria paisagem, quase como se lhe seguisse o pulso.

Aqui, cada quilómetro acrescenta história, cada curva traz uma aldeia que podia ser cenário de um filme medieval, cada subida revela um território que sempre viveu entre dois reinos, duas culturas e duas formas de olhar o mundo.

A GR22 atravessa cerca de 900 quilómetros, sempre fiel à identidade das Aldeias Históricas, agora estendida a Espanha, e revela um mosaico de lugares tão diferentes entre si que ninguém as percorre sem criar um ranking emocional.

Há sempre uma favorita, e outra que surpreende contra todas as expectativas.

GR22: pelo espírito das aldeias históricas

Monsanto, por exemplo, continua a ser aquilo que promete no folheto, um monólito vivo. Casas encaixadas entre penedos, ruas tortas, uma vista que se abre num anfiteatro natural sobre a Beira Baixa.

Caminhar por ali, sobretudo ao fim da tarde, é sentir o granito a aquecer lentamente antes de a noite cair. A GR22 passa pelo topo, junto às ruínas do castelo, onde o vento sopra daqueles que parecem séculos acumulados.

Mais a norte, Sortelha impõe-se de forma completamente diferente. A aldeia é circular, guardada por muralhas impecavelmente conservadas, e tem aquela serenidade de lugar que não precisou de inventar nada, basta-lhe existir.

Entrar pela Porta da Vila e subir até ao castelo é um daqueles rituais que qualquer caminhante da GR22 acaba por repetir, mesmo que já conheça o percurso. O silêncio ali não é falta de vida: é identidade.

E depois surge Castelo Rodrigo, pousado numa colina com um orgulho que lhe fica bem. Quem chega pela GR22 vê primeiro o perfil da muralha, depois o casario em tons de terra, e só então os pequenos detalhes: a cisterna medieval, a antiga casa dos Frades, a rua estreita que conduz até ao miradouro sobre o Vale do Águeda.

É uma aldeia que parece contar histórias mesmo quando ninguém fala.

Por montes e serranias

castelo de Trancoso à noite

A rota continua, firme, até Linhares da Beira, talvez a aldeia mais elegante do conjunto. Aqui, o castelo ergue-se com imponência, mas sem a agressividade de outros tempos.

A aldeia estende-se em declive suave, com solares, pelourinho e uma praça que parece ter sido desenhada para conversas demoradas. Linhares respira uma certa aristocracia serrana, e quem passa nota isso nas pedras, nos ritmos, no modo como o próprio silêncio soa.

Trancoso, por sua vez, funciona como contraponto, com muralhas amplas, um casario mais extenso, e uma sensação de cidade medieval que nunca perdeu a centralidade no território.

Dentro das muralhas, o tempo dilata-se. fora delas, o horizonte abre-se para campos vastos que acompanham o caminhar por longos troços da GR22. Trancoso é uma espécie de charneira entre várias paisagens e isso sente-se nos trilhos que partem dali.

GR22: entre Portugal e Espanha

Vista aérea de Almeida na rota da GR22

Há ainda outras aldeias que se revelam com discrição mas deixam marca. Marialva, por exemplo, que parece um cenário desenhado a carvão.

Idanha-a-Velha, com o seu passado romano e visigótico tão visível que quase se tropeça nele. Almeida, com a estrela perfeita que forma a sua fortaleza abaluartada, talvez a obra de engenharia militar mais impressionante do conjunto.

A GR22 cose todas estas aldeias, estas atmosferas e estes tempos diferentes. Não é apenas uma rota, é um corredor cultural onde Portugal e Espanha se tocam sem cerimónia.

A ampliação para Espanha permitiu a internacionalização de uma marca portuguesa para Espanha no domínio da mobilidade suave.

A par da monumentalidade cultural, na GR22 também percorre agora alguns dos mais belos parques naturais dos dois países, classificadas como Património Mundial da UNESCO.

Falamos do Parque Natural do Douro Internacional e Parque Arqueológico do Vale do Côa, o Parque Natural do Tejo Internacional ou o Parque Natural da Serra da Estrela.

Muitas etapas unem tanto a fronteira que se percebe a influência mútua nas tradições, na gastronomia, na própria forma de construir casas ou de aproveitar a paisagem.

O percurso está completamente sinalizado e admite ritmos variados. Pode ser feito em longas travessias, dia após dia, ou em pequenas incursões, escolhendo apenas as aldeias que mais chamam.

Há trechos duros, sobretudo nas zonas serranas, e outros incrivelmente suaves, ideais para quem quer apenas caminhar ao final da tarde e terminar a jornada numa esplanada com vista para muralhas centenárias.

A GR22 é um convite a percorrer um território com passado denso e presente vivo. Ponha-se a caminho.

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