Isadora Freitas
Isadora Freitas
23 Mar, 2018 - 11:54

Postais do Camboja: uma viagem à Tailândia com janela para o mar

Isadora Freitas

Cinco dias no Sul da Tailândia que não irão cair nas teias do esquecimento. Cinco dias felizes na companhia da Embaixadora dos Pequenos Gestos.

Postais do Camboja: uma viagem à Tailândia com janela para o mar

Querida R.,

escrevo-te sobre as aventuras que passámos juntas na Tailândia, não em jeito de novidade mas porque as memórias são contos pessoais que ganham novos contornos de baú para baú. Escrevo-te sobre os dias em que trouxeste Sol a este canto já tão cheio dele.

Janeiro foi um mês feliz, de começos e novas promessas, e Fevereiro um mês de abrir a janela para o mar. De caminhar de novo de pés descalços na areia quente.

Partimos numa segunda-feira à noite, depois de dançarmos de olhos fechados para o Mundo e abertos para o Universo que só a música sabe trazer à vida. Partimos naquela que seria uma das viagens de autocarro mais desconfortáveis das nossas Histórias – um daqueles episódios de que falamos com um sorriso no rosto quando de volta ao ninho mas que, quando a vivê-lo, só esperamos que passe num abrir e fechar de olhos. Foi pior para ti, sei-o bem. Eu, com as pernas que copiam a pequenez física da avó, consegui caber no banco desajeitado. Consegui descansar os sonhos na tua almofada e aquecer o corpo com a tua manta (achada e não roubada) enquanto tu te estendias no chão frio com a almofada inexistente onde não pousar a insónia, feita Embaixadora dos Pequenos Gestos.

Pouco depois de vislumbrarmos o sol pela janela, saltámos para fora do veículo infernal para atravessarmos a pé a fronteira, essa criação do Homem, rumo a um outro Mundo entrópico, rabiscado de novos caracteres e cores.

Depois de parecermos pequenas formigas nas estradas tingidas de caos em Bangkok, partimos, finalmente, nas asas emprestadas de um avião da Thai Lion, rumo a Krabi, um paraíso aninhado no Sul da Tailândia.

placeholder-1x1

Por vezes, esqueço-me do quão fácil é fazer-nos felizes. Bastou colocarmos os pés no pequeno barco com destino a Raillay Beach para esboçarmos um sorriso tonto de meninas do mar.

A ilha, que nos sorriu ao longe, sorriu-nos de novo ao nela pousarmos. De corpos cansados e Almas já retemperadas com o sal que lhes faltava, caminhámos até ao hostel onde nos esperava um escadaria sem fim à qual quisemos escapar com a ideia – absurda e genial – de saltarmos para dentro do pequeno elevador medieval ali colocado para as venturosas malas e mochilas. Nessa noite de lua (quase) cheia, petiscámos junto ao mar e brindámos com cerveja tailandesa – de preço que faz erguer sobrancelhas – a umas férias felizes e cúmplices.

Raillay Beach é um sítio encantado onde a infinitude do mar encontra conforto na montanha. Onde pequenos barcos servem comida no rebentar das ondas. Onde, de caiaque, me convenceste a entrar numa gruta em que as paredes ásperas sussurravam palavras serenas. Dois dias passaram sem que o relógio nos fizesse despertar para a realidade longe da janela para o mar.

placeholder-1x1

Não partimos, claro, sem que antes subíssemos ao miradouro por um trilho acidentado que nos levou a desafiar a gravidade. Trilho que subi com o cuidado das tuas mãos atrás de mim, que, sem me tocarem, me puxaram até ao topo – até ao canto por entre as árvores de onde conseguimos ver toda a ilha, cintilante sob o sol da manhã.

placeholder-1x1

Ao Nang é – e sabe a – cidade. Percorremos as suas ruas repletas de lojas vezes sem fim. À procura de nada e a encontrar de tudo. Sentámo-nos a ouvir música ao vivo, recebemos palavras de malícia de uma vendedora de Alma zangada e partimos naquela que seria a mais bonita viagem de barco de todas as minhas Primaveras (Verões, Outonos e Invernos). Uma divagação feliz por quatro ilhas em que te vi ganhar guelras e barbatanas à procura de seres exóticos – como tu, do mar – e em que nos sentámos em toalhas de praia com seis outros viajantes para um piquenique ao pôr do sol. Vi-te brilhar nesse dia, como só brilhas quando te fundes com o teu elemento. Vi-te colocar um sorriso imenso no rosto do nosso guia, ágil e engenhoso, Mr. Chang. Vi-nos felizes.

placeholder-1x1
placeholder-1x1

Regressei a Bangkok já sem te ter por perto. Deambulei pelas ruas desarrumadas e luminosas da cidade, perdida durante horas na Khao San Road, à espera que soassem as doze badaladas para entrar, de novo, no veículo maquiavélico rumo a Siem Reap. Surpreendentemente, o interior já não fazia congelar as orelhas e sem a tua almofada (porém, com a tua manta) – que é como quem diz sem ti –, a viagem de regresso de doze horas tornou-se no único momento dessas dias no paraíso condenado ao esquecimento. Todos os outros foram já colocados no Armazém da Memória, em caixas à mão de semear – porque farão brotar, sem ses ou senãos, novas e felizes aventuras, tenho a certeza.

Por tudo isto, obrigada, R. Espero-te bem e reluzente em terras de moliceiros.

Um Até Já com Saudade.

Veja também: