Mónica Carvalho
Mónica Carvalho
26 Mar, 2021 - 12:12

Vilar de Perdizes: aldeia de mezinhas e misticismo

Mónica Carvalho

Há mezinhas, curandeiros e até coisas que se dizem do oculto. Há um congresso de medicina popular que arrasta multidões. Conheça Vilar de Perdizes.

Paço de Vilar de Perdizes

Vilar de Perdizes, em Montalegre, é um dos destinos preferidos de curandeiros, alegados bruxos, putativos astrólogos e até cientistas e investigadores. Mas o que têm estas pessoas em comum? O Congresso de Medicina Popular que deu fama à aldeia barrosã e que reúne especialistas do mundo do esotérico e do mundo da ciência.

Isto não aconteceu por acaso. No início da década de 80, o padre António Fontes considerou que os encantos naturais e o poder das plantas da região deveriam ser partilhados com o resto do país. Algo invulgar para uma pequena região, mas que é, na verdade, dotada de tão grandes e até misteriosos poderes, como consideram ainda hoje os locais.

Assim, a aldeia de Vilar de Perdizes é o ponto de encontro de dois mundos tão diferentes, mas que parecem encontrar no local o momento perfeito para a troca de ideias. Quase 40 anos de tradição deste evento assim o provam.

Mas não é só por isso que Vilar de Perdizes tem esta conotação de misticismo. Saiba mais.

Padre António Fontes
O padre Fontes é o grande impulsionador do congresso de medicina popular

Como referimos, Vilar de Perdizes foi catapultada para a fama nacional por receber o Congresso de Medicina Popular, um evento sócio-cultural com longa história. É um evento anual, que decorrer no final do verão. Nele estão presentes cientistas e investigadores, assim como curandeiros, bruxos, videntes, astrólogos, tarólogos e massagistas. Uma convivência saudável entre ciência e métodos populares e alternativos que ainda hoje dá que falar.

O congresso foi impulsionado em 1983 pelo padre António Fontes que quis dar a conhecer “o valor da medicina popular e o poder das plantas para combater doenças”. Porém o evento foi de tal forma bem recebido, que se tornou num ex libris da região, impulsionando hotelaria, restauração e comércio.

Soluções naturais

Com este evento, espera-se mostrar aos visitantes que a saúde não depende só das farmácias e que se pode, também, encontrar soluções nas plantas, na acupuntura, na osteopatia ou nas massagens. Se são alternativas que fazem bem à saúde física e mental, então, são bem-vindas.

Claro que só a ideia é, de si, bastante polémica. Todavia, os responsáveis pela organização e defesa deste evento local mantêm-se intocáveis pela controvérsia.

“Recusamo-nos a que nos lancem o anátema de pagãos e hereges pelo facto de querermos alcançar, enquanto é tempo, os saberes (no campo da farmacologia, da medicina e das tradições) dos nossos avós! Esperemos que a gente de Vilar continue a acarinhar as ervas com que se fazem mezinhas, defumatórios, infusões e chás que nos debelam as dores do corpo e nos dulcificam as dores do espírito! Estão em fase de conclusão os roteiros arqueológico e do contrabando, que a pé e a cavalo de burros irão permitir a visita aos locais que melhor defendem a identidade de Vilar de Perdizes.”

Cabe, assim, à Associação de Defesa do Património de Vilar de Perdizes promover e defender o património e as tradições da aldeia, através da organização e participação nos eventos desta mítica terra, sejam eles mais ou menos bem aceites. Os planos só foram mesmo alterados pela pandemia, que obrigou ao cancelamento de algumas festividades e ao ajuste de outras. No ano passado, o congresso realizou-se online. Quanto à edição deste ano, ainda é uma incógnita.

Sexta-feira 13 é sempre dia de festa

Mas não é só o congresso que traz novas gentes à terra. Desde 2002 que a sexta-feira 13 significa festa a valer em Montalegre, especialmente em Vilar de Perdizes. Se acha que o dia é de azar, para os locais não poderia estar mais errado. Por lá, a população convive em perfeita harmonia com bruxarias, poções mágicas, mezinhas e curas.

A par disso, também a noite de Halloween é grande motivo de alegria na aldeia. Mais uma vez, foi o sacerdote da aldeia, António Fontes, que iniciou a tradição dos jantares todas as sextas-feiras 13. Então, é comum haver banquetes privados entre amigos e até um grande evento público que atrai mais de 40 mil pessoas todos os anos, algo que deve voltar a acontecer assim que pandemia o permita.

Nestes dias mais místicos, a pequena aldeia é invadida por curiosos que procuram ver bruxas, diabos e mafarricos e a queimada e esconjuro do padre António Fontes.

neve na serra do larouco em Montalegre
Não perca Montalegre: neve já chegou às terras mais altas

Mas nem só de misticismo vive Vilar de Perdizes

A par de Salto e Tourém, e apesar da sua pequena dimensão, Vilar de Perdizes é uma das mais cosmopolitas freguesias do concelho. É uma zona tipicamente barrosã, habitada desde remotas eras, como se prova pela existência e características de determinados monumentos. Um deles é o Paço de Vilar de Perdizes.

Trata-se de um complexo de grande valor histórico constituído por solar e hospital, botica, capela com cruzeiro e que se localiza numa zona pertencente aos Caminhos de Santiago. Aliás, foi precisamente para apoiar os peregrinos que este Morgadio foi criado.

O local terá ainda desempenhado um papel importante na introdução da cultura do bicho-da-seda em Trás-os-Montes, sendo Vilar de Perdizes o local que testemunhou as primeiras experiências nesta área.

Mais pontos de interesse repartem-se pelas fontes de mergulhos, lagares e os fornos comunitários espalhados pela freguesia, assim como pela Igreja de São Miguel, também denominada de Igreja Matriz de Vilar de Perdizes.

O edifício possui uma arquitetura interior e exterior interessante e até algo tradicional, com um longo corpo e uma frente que se ergue imponente para receber os devotos. A sua história remonta, pelo menos, ao século XI. A igreja possui uma imagem esculpida em pedra do deus Larouco. Isto não seria estranho se Larouco não fosse um deus pagão que deixou a sua marca num edifício cristão. Foi também ele quem deu o nome à Serra do Larouco, ali nas imediações.

A serra situa-se a nordeste de Montalegre e integra o Maciço Antigo, sendo a segunda serra mais elevada de Portugal, com uma altitude máxima de 1.527 metros. É um local de beleza ímpar e do seu topo podem observar-se os vales do Lima, Tâmega, Cávado e Rabagão, e também várias aldeias e até a Vila de Montalegre. Além de poder desfrutar da paisagem, poderá fazer passeios a cavalo, caminhadas, praticar asa delta, parapente e até escalada.

Passadiços

Em Vilar de Perdizes, deve também visitar as Olas de Santa Marinha, um local de grande beleza natural, composto por grandes formações rochosas e por onde passa o rio Assureira. O local possui várias árvores e passadiços em madeira, que convidam a caminhadas e passeios em segurança.

Também o Penedo do Caparinho, ou Penedo do Matrimónio, é um dos pontos de visita obrigatória. O motivo? As gravuras rupestres que por lá se encontram e que representam rituais associados à fertilidade humana. Na área envolvente, podem, igualmente, observar-se mais rochas gravadas, sendo que uma corresponde a um afloramento granítico e outra assemelha-se a duas estrelas.

Conheça um pouco mais sobre Montalegre

Situada em Trás-os-Montes, entre as serras do Gerês, Barroso e Larouco, e no vale do rio Cávado, Montalegre é zona de montanha com uma natureza em estado selvagem, ao mesmo tempo que se encontra rodeada de tranquilas e acolhedoras povoações, nas quais a agricultura e a pecuária marcam a economia e a rotina do dia a dia.

Especialmente famoso pela Feira do Fumeiro, Montalegre tem muitas outras festividades mediáticas como as referenciadas que ocorrem em Vilar de Perdizes. E é nessas alturas que a vila ganha mais vida e se parece transformar.

Todavia, poderá visitar Montalegre em qualquer época do ano, especialmente dos meses de temperaturas mais amenas, nomeadamente de maio a setembro. No inverno, saiba que as temperaturas são especialmente frias. De tal forma que em alguns anos mais rigorosos, até ocorre o sincelo na Serra do Larouco. Trata-se de um fenómeno meteorológico extremo que origina situações de nevoeiro aliado a temperaturas negativas e resulta do congelamento das gotas de água.

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