Valdemar Jorge
Valdemar Jorge
21 Dez, 2023 - 11:26

Renault 4L: o primeiro carro de muitos portugueses

Valdemar Jorge

Todas as marcas têm um ou mais modelos considerados ícones. O Renault 4L ocupa esse lugar no construtor francês.

Renault 4L na estrada

O Renault 4L marcou uma época no panorama automóvel nacional, entre os anos de 1961 e 1994. Durante 33 anos colheu sucessos e hoje é reconhecido como um dos ícones da marca francesa. Agora, vai reaparecer elétrico. Mas é uma longa história de sucesso, fundamental na história do construtor francês.

Mais de oito milhões de unidades comercializadas em todo o mundo dizem bem do sucesso deste pequeno citadino, que estava preparado para circular em todo o tipo de terrenos, tendo conhecido versões 4×4 e sucesso em provas desportivas de ralis.

Este pequeno modelo apaixonou milhares de portugueses e respetivas famílias e não só. Muitas empresas viram no Renault 4L um aliado no dia-a-dia de trabalho, usando-o durante décadas.

Outras empresas incluíram-no nas suas frotas e não raras vezes era possível ver o modelo francês a integrar as viaturas de serviço de diversos quartéis de bombeiros ou da Polícia de Segurança Pública.

Saiba mais sobre a história deste modelo clássico.

Renault 4L: conquistar clientes ao 2CV

No final dos anos 50, alguns automóveis faziam sucesso na Europa e no mundo. Era o caso do 2CV e do Renault 4CV, também designado por Joaninha. A Renault queria substituir o 4CV, mas tinha como objetivo continuar a marcar o sucesso com o seu sucessor.

Pierre Dreyfus, presidente, à época, da Renault, reuniu os melhores técnicos e traçou as linhas do que seria o novo automóvel da marca. Este teria de cumprir algumas premissas: ser simples, moderno, barato e funcional.

Para além disso, a motorização não deveria ultrapassar os 600 cc e os 20 cv e, acima de tudo, o novo modelo teria de dar resposta a tudo e todos. Ou seja, seria tão eficaz na cidade como no campo. Mais ainda, seria capaz de transportar famílias e ser eficiente no dia-a-dia de trabalho, nos mais diferentes setores.

Assim, definida a estratégia, os técnicos da Renault trabalham afincadamente e apresentaram o 4L, também conhecido como R4, em 1961.

Após a realização de mais de milhão e meio de quilómetros e testes que aferiram as capacidades do novo citadino, a produção arrancou em Maio de 1961.

Ao contrário do 4CV, este tinha motor e tração à frente e adotava chassis plataforma, que tornava mais acessível o compartimento para bagagens e suspensão, independente às quatro rodas, com amortecedores colocados em posição vertical e barras de torção em ambos os eixos.

Habitáculo marcado pela simplicidade

Para que o Renault 4L cumprisse as exigências lançadas por Pierre Dreyfus, o habitáculo tinha, forçosamente, de ser funcional e simples.

Deste modo, o novo automóvel acomodava 4 passageiros sem problemas, em bancos estruturalmente simples, só com forro e com a estrutura a descoberto quer lateralmente, quer por detrás. O espaço para bagagens era generoso e, sem assentos traseiros, disponibilizava 950 litros de capacidade.

O quadro de instrumentos recebia apenas velocímetro e marcador de combustível. O volante era de três raios, o retrovisor estava colocado ao centro do painel, no habitáculo e a maneta da caixa de velocidades seguia a tendência do 2CV.

Como novidade, o Renault 4L foi o primeiro automóvel do mundo a receber sistema de refrigeração selado. Assim, evitava a perda e a necessária reposição do líquido de refrigeração.

Também tinha distância entre eixos diferente à direita, 2,45 metros e 2,40 metros à esquerda, por imposição do sistema de suspensão traseiro.

Renault 4L estacionado
O Renault 4L foi um estrondoso sucesso de vendas

Renault 4L conquista automobilistas

Nos anos seguintes, o Renault 4L conquistou o público e impôs-se nos mercados, nomeadamente em Portugal onde era visto com frequência, tal o nível de vendas que atingiu.

O sucesso obrigou a que a marca fosse realizando as necessárias atualizações e lançamento de modelos diversificados que tinham por objetivo dar resposta às exigências do público.

À motorização e versão iniciais associou-se, em 1962, a versão Super. Esta caraterizava-se por receber motor de 747 cc de 27 cv, caixa de quatro velocidades (anteriormente três velocidades) e a velocidade máxima superava os 100 km/h.

Em 1964, o sucesso já era de tal forma elevado que a marca francesa apresentava a versão Parisiénne em parceria com a revista feminina Elle.

Esta nova versão destacava-se pelo arrojo da pintura exterior e por receber bancos dianteiros individuais. O conjunto tinha charme e conquistava com facilidade o público feminino. O motor recebia também um novo ajuste. Assim, passava para 845 cc e 34 cv, enquanto a velocidade máxima já chegava aos 115 km/h.

Outra novidade foi a versão furgão, em 1965, com capacidade de carga aumentada e com a particularidade de possuir abertura no teto para poder transportar mercadorias mais altas. A porta traseira podia ser de abertura lateral ou, em opção, vertical bipartida.

O ano seguinte, 1966, marcava a chegada ao milhão de unidades comercializadas. Para além disso, ficou marcado por novo desenho da secção frontal. Também no habitáculo o painel era totalmente redesenhado e os bancos ganhavam mais conforto ao serem individuais e totalmente forrados.

Eficácia, qualidade e conforto

À eficiência do Renault 4L, a pouco e pouco, juntou-se a qualidade e o reforço do conforto dos passageiros. Neste contexto, surge a versão Super Confort com acabamentos aprimorados, bancos mais confortáveis e vidro da quinta porta descendente. No entanto, a versão que mais conquistava o público era a designada L.

Ao longo dos anos, o Renault 4L foi recebendo importantes atualizações como em 1975: painel de instrumentos novo, maior, com acabamento em preto e proteção em borracha.

No entanto, existiam elementos que mantinham a sua posição inicial, como era o caso do espelho retrovisor e da caixa de velocidades. Neste ano surgiam também os bancos anatómicos e com apoio para a cabeça. Este elemento reforçou a segurança dos passageiros em caso de acidente.

O pequeno Renault atinge novo patamar de sucesso em 1977, com a chegada aos cinco milhões de unidades comercializadas. Sucesso após sucesso, o produto ia recebendo atualizações cada vez mais importantes no capítulo da segurança, uma preocupação antiga da marca francesa.

Deste modo, 1983 marca a introdução dos travões de disco dianteiros no Renault 4L. Neste ano o motor aumenta também de cilindrada para 1.108 cc, 34 cv e a velocidade máxima chega a 122 km/h.

O sucesso do Renault 4L refletia-se nas versões disponíveis: TL, GTL e GTL 4×4.

Motor eficiente e robusto

As mecânicas que ao longo de 33 anos equiparam o Renault 4L têm um denominador comum: eficiência e robustez.

Estas facilmente atingiam quilometragens superiores a 200 ou 300 mil kms. Assim, os condutores tinham poucas preocupações com a manutenção do 4L, uma vez que possuía uma mecânica simples e de fácil acesso.

Um dos cuidados principais para que os motores dos 4L funcionassem como “relógios” era vigiar o frasco do líquido de refrigeração.

Assim, se apresentasse cor térrea, era indispensável fazer a troca do líquido, não sem que antes circulassem alguns dias com água naquele depósito com a finalidade de limpar o sistema. Depois, bastava colocar a carga definitiva de líquido de refrigeração de qualidade e tudo voltava ao normal. Simples, barato e acima de tudo eficaz.

Preço acessível marcou o sucesso do 4L

Um dos atrativos, e que impulsionou o sucesso do Renault 4L em Portugal, foi precisamente o seu preço. Em Portugal, em 1965, o valor de aquisição era de 49.640$00 (menos de 250 euros, atualmente). Associado ao valor estava a fácil manutenção e o baixo consumo de combustível a cada 100 km.

Para além disso, outro dos fatores que contribuiu para que fosse tão acarinhado pelos automobilistas foi o facto de ter mantido, na génese, o design exterior e interior. Foi apenas alvo de atualizações na forma, que nunca chegaram a colocar em causa o conceito, nem a visão dos seus projetistas.

O Renault 4L foi fabricado em 26 fábricas em todo o mundo. Desde Trinidade e Tobago ao Chile, passando pela Eslovénia, Costa do Marfim, Madagáscar, Marrocos e ainda o Zaire. As normas anti-poluição ditaram, no entanto, o fim da sua produção, em 1993.

Com ele a Renault viveu uma época de ouro. Durante 33 anos soube potenciar um produto que atualmente ainda desperta curiosidade e a união de automobilistas.

Veja também